Peso dos tributos na conta de luz dos brasileiros ultrapassa 50% da fatura

Últimas Notícias
Contas de luz dos brasileiros embutem encargos com finalidades diversas, como cobrir o consumo da população de baixa renda, viabilizar a operação de usinas termelétricas e estimular fontes alternativas de energia...

Contas de luz dos brasileiros embutem encargos com finalidades diversas, como cobrir o consumo da população de baixa renda, viabilizar a operação de usinas termelétricas e estimular fontes alternativas de energia

 

No país dos subsídios, o setor elétrico é um dos que mais têm encargos e penduricalhos para bancar uma série de programas e descontos. Mais da metade da receita das empresas de geração, transmissão e distribuição de eletricidade são impostos, contribuições e encargos que embutem subsídios de toda sorte. Do carvão mineral para geração termelétrica e do combustível usado pelas usinas térmicas de sistemas isolados até descontos no uso dos fios em determinados empreendimentos e abatimentos nas tarifas de alguns consumidores, passando por programas sociais e assistenciais, tudo está dentro da fatura mensal de energia elétrica dos brasileiros.

 

Estudo do Instituto Acende Brasil mostra que a carga tributária consolidada atingiu 51,64% do total da receita bruta operacional do setor elétrico em 2015. No exercício anterior, o mesmo levantamento havia registrado índice de 40,23%. Houve, portanto, aumento de 28% de um ano para o outro. Na pesquisa mais recente, tributos e encargos representaram R$ 88,1 bilhões da receita de R$ 170,7 bilhões.

 

O presidente do Acende Brasil, Cláudio Sales, ressalta que a tributação em energia elétrica é injusta, porque atinge a camada da população com menor renda. “A fatura pesa mais no orçamento das famílias mais pobres”, alerta. “O estudo, feito em parceria com a PWC, descortina o grande drama tupiniquim, de carga tributária sempre acima de 40%, o que afeta diretamente a competitividade da economia”, diz Sales.

 

De acordo com o Ministério de Minas e Energia (MME), hoje, a maior parcela dos subsídios do setor está embutida na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE). Isso ocorreu quando a ex-presidente Dilma Rousseff promoveu o maior desarranjo regulatório do setor com a famigerada Medida Provisória nº 579, de 2012, depois convertida na Lei nº 12.783, de 2013. “O reflexo de esconder tudo dentro da CDE com a MP 579 foi o salto que vimos de um ano para o outro no peso dos encargos. Embora tenha se mantido acima de 40% desde 2002, em 2015 passou de 51%”, explica Sales.

 

Tarifas

 

A conta de energia abarca inúmeros encargos (veja no quadro ao lado), mas, dentro da CDE, estão subsídios para bancar: a Tarifa Social de Energia Elétrica (TSEE); descontos na Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão (Tust) e na Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (Tusd) para pequenos empreendimentos hidrelétricos e de fontes solar, eólica, biomassa e cogeração; descontos nas tarifas de energia elétrica para consumidores rurais, irrigantes e aquicultores, para aqueles enquadrados como prestadores de serviço público de água, esgoto e saneamento e irrigação pública, além de distribuidores de pequeno porte, como cooperativas, permissionárias ou concessionárias; e, por fim, a universalização do acesso à energia elétrica, por meio do programa Luz para Todos.

 

Sales chama a atenção para a Conta de Consumo de Combustível (CCC), criada para subsidiar o combustível das termelétricas de sistemas isolados. “Antes, a CCC, usada para financiar o combustível das geradoras do Norte que não estavam conectadas ao Sistema Interligado Nacional (SIN), era custeada pela conta de luz de todos os consumidores. Com a MP 579, foi parar dentro da CDE. A grande enganação de Dilma é que o Tesouro ia bancar a CDE, mas isso durou só um ano. O governo ficou sem dinheiro e a CDE voltou a ser custeada pelos consumidores, com o agravante de não ter transparência”, explica.

 

Custo rateado

O especialista pondera que o subsídio de combustível já se justificou. “Como a geração de energia termelétrica é muito mais cara e, para alguns sistemas isolados, era o único recurso, foi uma política pública subsidiar a CCC e ratear o custo entre todos consumidores enquanto não se conseguia interligar as regiões ao SIN”, diz. No entanto, ressalta Sales, a interligação já foi feita. “Em tese, não há mais necessidade de subsidiar a maioria das regiões. Porém, os estados atingidos reclamam uma receita importante de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) em cima dos combustíveis. Aí começa uma série de distorções”, aponta.

 

Sales reconhece que, em um país como o Brasil, de “múltiplas carências”, é fácil justificar a conveniência de subsidiar alguns setores. “Mas é muito contraproducente aumentar os encargos indefinidamente. Chega-se a um ponto em que isso é danoso. Se o Brasil  tem carga tributária que é considerada alta para países emergentes, a do setor elétrico, por ser regressivo, com maior impacto no orçamento dos mais pobres, deveria ser menor. No entanto, é assustadoramente maior”, lamenta.

 

Na opinião do especialista em energia Rodrigo Leite, sócio do escritório Leite Roston Advogados, a parcela de subsídios e encargos na conta de energia é significativa. “Muito foi criado para subsidiar os setores mais frágeis. É legítimo pensar nisso para se ter uma base de ampliação da rede e maior receita no futuro”, explica. Contudo, Leite ressalta que o “mais grave” é que os recursos da CDE, muitas vezes, são usados para compor subsídio cruzado. “Há uma proposta do MME, atualmente em consulta pública, para definir diretrizes do novo marco regulatório, que pretende acabar com os subsídios cruzados, que são jogados na tarifa”, diz.

 

Leite afirma que os descontos no fio para fontes de geração como biomassa, resíduos e Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCH) vão de 50% até 100%. “É interessante para incentivar a produção por novas fontes, mas acaba onerando a distribuidora e a transmissora, que repassam o custo para os consumidores”, ressalta. O especialista lembra que os subsídios saem do mesmo bolso — ou do consumidor, via tarifa, ou do contribuinte, quando o dinheiro sai do Tesouro, que arrecada impostos. “Não se pode tapar buraco de falha estrutural do setor com subsídio. Isso só ocorre no Brasil, onde há muitas contas paralelas. O mercado europeu é muito mais livre”, afirma.

 

Fonte: Correio Brasiliense