Para STJ, desvio de finalidade no uso de recursos do Finor é crime financeiro

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O ministro Schietti entendeu que o optante do Finor torna-se investidor do fundo

A aplicação de recursos já integrados ao patrimônio dos investidores do Fundo de Investimentos do Nordeste (Finor) em finalidade diversa da prevista em lei ou contrato configura crime financeiro — e não tributário —, enquadrando-se no delito do artigo 20 da Lei 7.492/1986.


Com esse entendimento, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça manteve a condenação de um empresário por desvio de finalidade na aplicação de verbas do Finor, negando seu pedido de desclassificação da conduta de crime financeiro para crime tributário.

Gerenciado pelo Banco do Nordeste, o Finor se destina a financiar projetos na área da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), contribuindo para o desenvolvimento econômico da Região Nordeste e de parte de Minas Gerais e do Espírito Santo.

Segundo os autos, uma empresa obteve recursos do fundo para a promoção de um projeto agropecuário na Bahia. Contudo, uma vistoria técnica detectou irregularidades na execução do empreendimento, com prejuízo para o Finor estimado em R$ 36 milhões.

O responsável pela empresa foi condenado, em primeiro grau, a seis anos, nove meses e 18 dias de reclusão, mais multa, pelo crime financeiro previsto no artigo 20 da Lei 7.492/1986 — sanção reduzida em segunda instância para três anos de reclusão.

Com o trânsito em julgado da decisão, a defesa ajuizou revisão criminal no tribunal de origem visando à desclassificação para o delito tributário descrito no artigo 2º, inciso IV, da Lei 8.137/1990 ("Deixar de aplicar, ou aplicar em desacordo com o estatuído incentivo fiscal ou parcelas de imposto liberadas por órgão ou entidade de desenvolvimento"), mas o pedido foi negado.

Ordem financeira x ordem tributária
O relator do recurso especial do empresário, ministro Rogerio Schietti Cruz, apontou que o artigo 20 da Lei 7.492/1986 está relacionado a irregularidades na aplicação de financiamento obtido em instituição financeira oficial, por meio de mútuo, vinculado a destinação específica, enquanto o artigo 2º, inciso IV, da Lei 8.137/1990 diz respeito a irregularidades de ordem tributária, em razão da não aplicação, ou da aplicação em desacordo com o estabelecido, de incentivo fiscal ou de parcelas de imposto liberadas por órgão de desenvolvimento.

De acordo com o magistrado, uma distinção importante entre as duas condutas é que, no crime financeiro, o financiamento decorre de um programa oficial, com custos subsidiados, destinado ao fomento de projetos, sem envolver (como acontece no delito tributário) o uso da tributação com finalidade extrafiscal, mediante dispensa ou atenuação de tributos com vistas à promoção do desenvolvimento.

Complexidade estrutural do Finor
Rogerio Schietti explicou que pessoas jurídicas contribuintes do Imposto de Renda pelo lucro real tinham a faculdade de investir nos fundos do Finor, mediante a destinação de parcela do IR. Os recursos desses fundos, portanto, eram originados da captação dessa parcela do imposto.

No instante em que os recursos obtidos pela renúncia fiscal eram destinados ao Finor, passavam a integrar seus ativos, elevando os cotistas à condição de proprietários de fração ideal. Dessa forma, o optante (investidor e beneficiário da renúncia fiscal) adquiria cotas de participação no fundo.

Ou seja, quando o optante decidisse investir parcela do Imposto de Renda no fundo de investimento, a União promovia renúncia fiscal sobre essa parcela e, a partir daí, não possuía mais a titularidade desse recurso, operando-se verdadeira transmutação do imposto em investimento, ressaltou o ministro.

Segundo o relator, eventual desvio na captação dos valores para compor o Finor, por se tratar de fundo de investimento decorrente de incentivo fiscal, caracterizaria o crime contra a ordem tributária previsto no artigo 2º, IV, da Lei 8.137/1990. Porém, quando esse desvio ocorre em relação aos recursos já integrados ao patrimônio dos investidores (disponibilizados mediante emissão de debêntures e sujeitos a ganho de capital com a venda), haveria a possível prática de crime financeiro.

Dessa forma, os recursos obtidos pela empresa da qual o recorrente era sócio seriam provenientes do financiamento ocorrido com os valores que já compunham o patrimônio dos investidores e que eram disponibilizados aos beneficiários, recursos estes que teriam sido aplicados em finalidades diversas das previstas no projeto, resultando daí um prejuízo para o Finor, "de modo que a conduta se amolda, tal como delineado na origem, àquela prevista no artigo 20 da Lei 7.492/1986", concluiu Schietti.

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REsp 1.731.450

Fonte: ConJur