Portaria prevê audiências no Carf apenas com presidente e relator

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Advogados argumentam que restrição limita ilegalmente o exercício da advocacia

O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) publicou nesta quinta-feira (15/10), no Diário Oficial da União, a Portaria Carf / ME 12.225, que regulamenta as audiências para tratar dos processos administrativos que tramitam no tribunal. Entre os pontos tratados na norma, chamou a atenção de advogados que atuam no tribunal a determinação de que contribuintes e advogados só podem solicitar audiência com o relator do caso ou com presidentes de turmas.

Em outro trecho, a portaria define que não será deferido pedido de audiência no caso de recursos com julgamento já iniciado. Pela norma, o pedido de audiência deve ser feito por formulário virtual, e as reuniões podem ser virtuais ou presenciais.

 

A limitação repercutiu entre advogados, habituados a despachar com os demais conselheiros. Eles argumentam que a restrição limita ilegalmente o exercício da advocacia. Segundo os especialistas, a regra cerceia o direito de defesa dos contribuintes. Eles afirmam que, devido à elaboração do voto, o relator já conhece bem o processo, e reunir-se com outros conselheiros serve para esclarecê-los.

“Os fatos são muito claros para o relator. Ele tem a obrigação de ter um conhecimento mais profundo do caso. Os outros não, e é importante expor a situação concreta, como realmente aconteceu. Então, essa limitação prejudica, sim, porque era a maneira que a gente tinha de explicar as razões para quem não tem o domínio do processo como o relator. Além disso, essa restrição do exercício da profissão é ilegal e inconstitucional”, afirma Júlio César Soares, do Advocacia Dias de Souza.

Breno Vasconcelos, sócio do Mannrich e Vasconcelos Advogados e professor e pesquisador do Insper e da FGV, afirma que a portaria viola o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que, no artigo 7º, inciso VIII, diz ser direito do advogado “dirigir-se diretamente aos magistrados nas salas e gabinetes de trabalho, independentemente de horário previamente marcado ou outra condição, observando-se a ordem de chegada”.

Ainda segundo Vasconcelos, há precedentes judiciais em que foram julgadas ilegais limitações do tipo. O advogado citou o recurso em mandado de segurança 18.296/SC, do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e decisão no MS 23.576 MC/DF, do Supremo Tribunal Federal (STF).

No primeiro, a ex-ministra Denise Arruda, do STJ, deferiu recurso em mandado de segurança coletivo da seccional em Santa Catarina da OAB (OAB-SC) contra decisão de magistrado do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) que estabeleceu horário de atendimento para advogados com limitação a casos urgentes. No segundo, o ministro Celso de Mello concedeu liminar garantindo a orientação do advogado ao cliente durante depoimento em CPI.

Breno Vasconcelos também critica a impossibilidade de solicitar audiência no caso de recursos com julgamento já iniciado. “Gera uma limitação à busca da verdade material, pois é comum que, após iniciado o julgamento, sejam necessárias novas audiências para esclarecer pontos de dúvidas que surgem na sessão. Se os procedimentos para audiência forem transparentes e públicos, nada justifica essa limitação”, afirma.

O que diz o Carf
A reportagem entrou em contato com a assessoria de comunicação do Ministério da Economia solicitando posicionamento do Carf sobre as críticas à portaria. O órgão se manifestou afirmando que a norma disciplina as audiências “nos moldes em que já são realizadas e bem aceitas pelos solicitantes”. “Eventualmente, outros conselheiros podem participar da audiência, porém a maciça maioria dos solicitantes busca o agendamento com o relator, até porque quanto aos demais conselheiros há sempre a oportunidade de entrega de memoriais e sustentação oral”.

Com relação à suposta violação do artigo 7º, inciso VIII do Estatuto da OAB, que garante aos advogados o direito de procurar magistrados a qualquer momento em seus gabinetes, o Carf afirma que “os conselheiros do Carf não dispõem de salas ou gabinetes de trabalho e, por questões relacionadas ao Código de Ética, a audiência deve contar com a presença de outro servidor”.


Fonte: Jota