Justiça fiscal em Goiânia só com atualização do Código Tributário, dizem especialistas

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Para que possa valer a partir de 1º de janeiro de 2022, projeto de lei tem até 30 de setembro para ser aprovado, segundo critério de noventena

Publicado em 20 de novembro de 1975, o atual Código Tributário Municipal de Goiânia é pauta de discussões nas várias esferas do poder em prol de sua atualização, há anos. No entanto, mesmo com o consenso de que a legislação em vigor está mais que defasada, o que antes não passava de uma mera expectativa ou de debates sem rumo, começou a tomar uma forma mais palpável este ano. Isso porque a Prefeitura criou um grupo de trabalho, chamado de Grupo de Estudo e Atualização, responsável por revisar todos os artigos e propor renovações que promovam justiça fiscal na cidade.

Essa, no entanto, não é uma tarefa fácil. São 384 artigos a serem analisados pelos sete representantes da Secretaria Municipal de Finanças, pelo representante da Secretaria Municipal de Governo, pelos três vereadores, três membros do Conselho de Desenvolvimento Econômico, Sustentável e Estratégico de Goiânia (Codese) e pelos membros representantes da seccional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB–GO) e do Conselho Regional de Contabilidade (CRC-GO) que compõem o grupo. Foram estipulados dez encontros temáticos para a realização desse trabalho.

As análises do grupo de estudo estão previstas para serem finalizadas no dia 31 de agosto, quando ocorrerá a última reunião com o objetivo de discutir a cobrança de taxas e contribuições de forma geral. Até o momento, já foram feitas as propostas acerca do Imposto Sobre Serviços (ISS) e do Imposto Sobre Transmissão de Imóveis (ISTI), também conhecido como ITBI, sendo o próximo passo a discussão acerca do IPTU. As reuniões, que ocorrem duas vezes na semana, por duas horas no período vespertino de toda terça e quinta, são regidas por um cronograma apertado, com a intenção conseguir a finalização do novo Código Tributário o quanto antes, para que o documento seja enviado à Câmara de Goiânia.

De grande complexidade, apesar da grande vontade expressa por parte da Secretaria Municipal de Finanças do próprio grupo de atualização montado pela Prefeitura, o entendimento geral, inclusive dos membros desse grupo, é de que existe uma grande possibilidade de que esse novo regimento não seja aprovado a tempo de entrar em vigor logo no primeiro dia de janeiro de 2022. Isso porque qualquer alteração no regime tributário segue o critério da noventena. Ou seja, precisa ser aprovado até 90 dias antes do início do próximo ano, prazo que se encerra no dia 30 de setembro.

Em concordância com essa previsão, que foi primeiramente expressa nos bastidores por entidades do setor produtivo, a representante da OAB no grupo de trabalho, Eléia Alvim Barbosa de Souza, que é presidente da Comissão de Direito Tributário da Ordem, afirma que, pelo tamanho e pela complexidade do projeto, sua aprovação só ocorrerá até o fim do prazo se parte dos 384 artigos acabar não sendo revisada. “Para fazer dar tempo pode ser que falem ‘daqui para frente, vai do jeito que está’”, afirmou.

O vereador Henrique Alves (MDB), também membro do grupo, no entanto, não acha prudente que ocorra qualquer aprovação sem que antes se tenha uma ampla discussão com a sociedade. “É obrigação nossa, isso precisa ser discutido, mesmo que seja aprovado e tenha validade somente para 2023, porque é importante que se faça esse debate. É um projeto muito complexo, polêmico e que demanda discussão para uma quantidade de tempo muito curta”, diz.

O tempo necessário de aprovação do projeto, querendo ou não, também passa por aspectos políticos e quanto ao questionamento se há base necessária para que o projeto passe de primeira, e a resposta divide opinião entre os vereadores.

Enquanto o vereador Mauro Rubem (PT) acredita que a Prefeitura já vem tendo dificuldades, por discordâncias dentro de sua base, Sabrina Garcêz (PSD) afirma que será necessário esperar para poder exatamente testar essa base na hora da aprovação e Henrique Alves (MDB) não acredita que esse aspecto seja realmente relevante para que a proposta passe. “independentemente de base ou não, o importante é discutir um bom projeto, que seja justo, que cobre os tributos de forma justa, que traga incentivos, promova empregos e atraia novas empresas. Isso é essencial para o futuro e principalmente para o momento em que estamos cada dia mais próximos, que é o pós pandemia e a retomada econômica”, explica o parlamentar emedebista.

O momento político, no entanto, para Sabrina, é o ideal para que o trâmite dessa proposta aconteça. “Acho que estamos no momento político ideal. É início de mandato, o prefeito Rogério tem demonstrado tranquilidade. Então é principalmente o momento de construir junto com os vereadores, com o setor produtivo e a sociedade. Precisamos aperfeiçoar esse código o mais rápido possível porque a população está sofrendo com o que é cobrado de imposto em Goiânia. Nosso IPTU é muito alto, nosso ISS é muito alto e é uma bagunça. Assim, então o cidadão não consegue nem recorrer, porque é tanta lei, foi tanto penduricalho que foi criado ao longo dos anos, que virou uma confusão”, opinou a parlamentar pessedista.

Prazo para tramitação e aprovação

A previsão relativamente pessimista quanto ao prazo de aprovação da matéria, por parte de entidades do setor produtivo, membros do Legislativo e outros órgãos se dá, porque quando as reuniões do grupo de estudo forem finalizadas, será apresentado um relatório ao prefeito da cidade, Rogério Cruz (Republicanos), com todas as propostas sugeridas, que dará a palavra final sobre o que entrará ou não no texto a ser enviado pela Câmara Municipal de Goiânia. O que ocorre, é que ao ser protocolado na Casa Legislativa, o projeto segue para a Procuradoria Jurídica da Câmara, que tem até dez dias para ser devolvido e seguir para a Comissão de Constituição, Justiça e Redação (CCJ), em seu trâmite normal.

Após passar pela CCJ, o projeto deverá ser encaminhado à primeira votação em plenário, após aprovação e para a comissão temática que, no caso, é a Comissão de Finanças, presidida pelo vereador Clécio Alves (MDB). Nessas comissões, o relator escolhido poderá pedir audiências públicas em prol de um maior diálogo com a sociedade e transparência em relação ao novo código. Somente após todas essas etapas é que o projeto seguirá para segunda aprovação no plenário da Casa e posterior sanção do Poder Executivo.

O cuidado para que todas as etapas sejam bem destrinchadas, analisadas e que seja realizado todo um parecer sobre o modo menos impactante a ser implantado se dá pela grande influência que o Código Tributário Municipal tem no cotidiano do cidadão comum. “O código impacta de várias formas na cidade inteira. É um projeto grande, complexo, que precisa ser modificado. Muta coisa mudou na nossa cidade, então é necessário se fazer justiça fiscal, ou seja, cobrar os impostos de forma mais justa e criar incentivos fiscais para algumas atividades que se quer potencializar e gerar mais emprego na cidade”, explica.

“Esse [o código em vigor] é um código ultrapassado, que vale há 46 anos. Hoje temos outra realidade. A cidade de Goiânia, há 46 anos não tinha metade dos habitantes, do número de carros, casas e contribuintes que tem hoje, então precisamos trazer essa realidade. Naquela época, a gente não tinha sequer operações tecnológicas”, complementa Eleia Alvim, membro do grupo de estudo e presidente da presidente da Comissão de Direito Tributário da Ordem dos Advogados em Goiás (OAB-GO).

Em tempos de pandemia, em que a cidade, o estado e o país caminham para o rumo de uma retomada econômica, para os especialistas, esse projeto torna-se ainda mais fundamental. Para Eléia, a nova legislação consiste no pilar dessa retomada. “O desenvolvimento econômico daqui para frente irá depender muito de como será a tributação de todos os setores para o contribuinte em geral”, pontua.

Para considerar o que se deve ser reduzido nas alíquotas cobradas, por exemplo, a advogada tributarista explica que cidades como Aparecida de Goiânia, Trindade e Senador vêm sendo utilizadas como exemplos a serem seguidos. A justificativa, para Eleia Avim, é a quantidade de empresas que Goiânia perdeu com a crise financeira gerada pela pandemia da Covid-19. “Por ser um período de retomada econômica, é preciso melhorar o ISS, porque nós perdemos várias empresas para cidades ao nosso redor justamente pelo valor do nosso ISS”, afirmou a vereadora Sabrina Garcêz, também membro do grupo de estudo, em concordância com a presidente da Comissão de Direito Tributário da OAB-GO.

Revitalização do Centro e incentivos

Um dos pontos importantes abordados até o momento nas reuniões do Grupo de Estudo e Atualização do Código Tributário Municipal, segundo a advogada tributarista e membro do grupo, Eléia Alvim, é a revitalização do centro da cidade. “Estamos tratando da necessidade de incentivar e fomentar a região do centro, para que ele volte a ser um bairro com empresas, turismo e entretenimento, setores que foram devastados pela pandemia”, pontua.

Para que isso ocorra, a advogada ressalta que a redução das alíquotas é um dos principais pontos a serem considerados. “O código tributário manda que as alíquotas de ISS sejam de 2 a 5%, mas no código atual, a maioria está em 5%. A ideia é que se reduza para 2 ou 3%. Área da tecnologia, por exemplo, é um dos pontos em que isso ficou bem discutido, com redução da alíquota para 2%, na intenção de atrair novas pessoas para Goiânia”, revela Eléia.

A possibilidade da realização de transações tributárias, que consistem em acordos realizados entre o contribuinte e o fisco e que já existe na Receita Federal, também está sendo cogitada. “A Prefeitura de Goiânia está colocando essa possibilidade para que o cidadão que tem déficit tributário possa negociar sua dívida diretamente com a Procuradoria Municipal”, pontua a presidente da Comissão de Direito Tributário da OAB-GO.

IPTU

Quanto à cobrança do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), que será discutida a partir da próxima semana pela equipe criada pela Prefeitura com o objetivo de analisar o Código Tributário Municipal, o secretário municipal de Finanças, Geraldo Lourenço, durante coletiva de imprensa, declarou a possibilidade de acabar com as zonas fiscais e manter a divisão de alíquotas segundo o valor venal do imóvel e seu uso – residencial, comercial e sem construção.

Apesar de concordar com a necessidade de se acabar com as zonas fiscais, a vereadora e integrante do Grupo de Trabalho, Sabrina Garcêz (PSD), não acredita que dividir as alíquotas conforme o uso do imóvel traga benefícios. “Primeiramente precisamos corrigir a questão das zonas fiscais. Ali na região do Alfaville, fora do muro, há pessoas que pagam a mesma quantia de IPTU de pessoas que moram dentro do condomínio. Já quanto a diferença entre imóvel comercial e residencial, acho que essa diferenciação tem que deixar de existir. O IPTU tem que ser cobrado em cima do valor do imóvel versus a alíquota, que tem que ser progressiva, de acordo com o valor daquele imóvel. Como é feito hoje, por zona ou por diferenciação de uso, não garante justiça fiscal”, opina.

Para o vereador Henrique Alves (MDB), que também compõe o grupo, o valor cobrado no IPTU, inclusive, contribuirá para a meta de revitalizar o centro da cidade. “Temos um centro já degradado onde se paga muito de IPTU, enquanto setores mais nobres pagam menos. Tudo isso tem que ser posto na mesa e discutido para que quem tem menos condição pague menos e seja possível desonerar pequenas empresas, promovendo condições de gerar mais empregos na cidade e melhorar a condição de vida da população”, pontuou o emedebista. “Goiânia é uma das cidades com maior concentração de renda das américas e isso nos coloca um desafio de que todas as medidas sejam direcionadas a diminuição da desigualdade, quem recebe mais contribui mais, e quem recebe menos seja até isentado de pagar”, complementa Mauro Rubem (PT).


Fonte: Jornal Opção