Por que o Brasil é um dos poucos países do mundo que não tributa dividendos

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Apenas Brasil, Estônia e Letônia não tributam dividendos

O Brasil é um dos poucos países ao redor do mundo que não tributa o pagamento de dividendos aos acionistas, segundo levantamento da Tax Foundation. A Estônia e a Letônia são os outros dois territórios que não cobram impostos na distribuição de resultados.

Mas nem sempre foi assim. Priscila Vergueiro, sócia da área tributária da EY, explica que um imposto sobre dividendos vigorou no país até 1995, mas foi abandonado em troca de uma alíquota maior do IRPJ (Imposto de Renda de Pessoas Jurídicas). “Naquela época, decidimos embutir a alíquota do imposto sobre dividendos na do IRPJ. Era uma forma de antecipar o recolhimento do tributo, já que a Receita não precisava esperar as empresas distribuírem os lucros para receber os valores”, diz.

Uma possível taxação de dividendos – atualmente em discussão no Congresso – pode colocar o Brasil em linha com as práticas adotadas pela grande maioria dos países, mas por outro lado, não aliviaria a alta carga de impostos paga pelas empresas no mercado doméstico, afirmam especialistas ouvidos pela Forbes.

Cofunciona a tributação dos dividendosmo 

Em comum, o Brasil e os outros dois países livres de impostos para dividendos compartilham tributos que incidem sobre a geração de lucros e que devem ser pagos pelas companhias, não pelas pessoas físicas.

Já os demais países adotam uma espécie de “tributação dupla”, em que parte da carga tributária incide sobre a geração de lucro da empresa, na forma de um imposto nos moldes do IRPJ (Imposto de Renda de Pessoas Jurídicas). A outra parte, incide no momento da distribuição desses valores entre os acionistas.

Por isso, para comparar a realidade brasileira com a do exterior, é necessário considerar os dois tributos juntos (pagos pelas empresas e pelos acionistas), assim como a CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido), que também é paga pelas empresas sobre o lucro, afirma Clarissa Machado, sócia do escritório Trench Rossi Watanabe.

No caso brasileiro, pesa ainda na conta final impostos indiretos, explica a advogada. “Vejo muitas pessoas comparando as alíquotas de IRPJ e da proposta de imposto sobre dividendos com as de outros países, mas é preciso considerar a tributação indireta sobre o consumo, que no Brasil é muito mais alta”, diz.

Um levantamento da consultoria EY mostra que a maioria dos países latinoamericanos têm alíquotas entre 5% e 15% sobre dividendos pagos aos acionistas. Considerando as alíquotas do tributo destinado às empresas, a carga tributária total fica entre 30% e 45%. No Brasil, esse indicador atualmente é de 25%, mas se incluirmos no cálculo a incidência da CSLL, a carga chega a 34%. Embora esse número esteja dentro dos limites vistos no continente, ele não leva em consideração os impostos indiretos, como observado por Clarissa.

Mudança para os dividendos

A segunda parte da proposta da reforma tributária apresentada pelo Ministério da Economia prevê uma alíquota de 20% sobre o pagamento de dividendos, e, em contrapartida, uma redução do IRPJ (cobrado das empresas com lucro superior a R$ 20 mil) de 25% para 20% a partir de 2023. A CSLL ficaria inalterada. Nesse cenário, a carga tributária seria de 43%.

O relator do projeto, deputado Celso Sabino (PSDB-PA), manteve as alíquotas da CSLL e do imposto sobre dividendos sugeridas pelo governo, mas propôs uma redução mais agressiva do IRPJ: de 25% para 12,5% – resultando numa carga de 37%.

Nos dois casos, haveria aumento dos valores devidos ao Fisco.

Segundo Priscila, a possível nova alíquota de IRPJ em torno de 20%, como na proposta original do governo, está alinhada com a prática dos países da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). A do imposto sobre dividendos, por outro lado, varia bastante segundo a especialista: os Estados Unidos aplicam 30%, os países europeus, em geral, 15%. “Essa aproximação entre as alíquotas nacionais e estrangeiras não quer dizer que o custo tributário esteja chegando na média internacional”, alerta ela, que compartilha da avaliação de Clarissa: o grosso da carga brasileira está nos tributos indiretos e previdenciários.

Priscila explica que, para que o sistema tributário brasileiro se tornasse similar ao dos países da OCDE, por exemplo, seria necessário uma reforma mais ampla, que incluísse outros tributos e unificasse alguns deles. “Temos no momento diversos projetos de lei circulando que buscam alinhar a estrutura tributária brasileira com algo mais próximo ao padrão internacional, mas eles estão tramitando de forma independente”, diz, acrescentando que isso pode gerar uma legislação final contraditória ou com alterações que não levam em consideração a totalidade do sistema tributário.

Há ainda um segundo problema nas propostas apresentadas até agora, avalia Priscila: os projetos não definem um período de apuração dos lucros para a incidência da alíquota. Isso significa que, se uma empresa decidir distribuir em 2023 lucros auferidos em 2021, por exemplo, irá pagar uma carga tributária mais alta que a atual. Isso aconteceria porque a companhia já teria recolhido o IRPJ à alíquota de hoje (25%) e deveria reter ainda os 20% do imposto sobre dividendos, totalizando 40%.

 

Fonte: Forbes Brasil