ICMS na base do PIS/Cofins: análise dos embargos no STF pacificará tema no Carf

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Parte das turmas do Carf não aplica o entendimento do STF por não haver o trânsito em julgado

A discussão no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a modulação da decisão que excluiu o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins pode pacificar a matéria também no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Isso porque o tribunal administrativo tem posições divergentes sobre o tema, com ao menos seis decisões diferentes sobre a principal tese tributária em curso no país. O JOTA identificou, até agora, duas vitórias aos contribuintes, no qual as empresas conseguiram a retirada do imposto estadual das bases das contribuições.

Enquanto parte dos conselheiros aplica o precedente favorável às empresas, outra parte acredita que, por não haver trânsito em julgado da decisão do STF, deve ser aplicado o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que definiu a inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins. “O Carf adota o artigo 62, paragrafo 2, do regimento interno, que menciona a necessidade de seguir ‘decisão definitiva’ de mérito do STF. Além disso, temos que ver qual será a forma da modulação aplicada”, explicou um conselheiro ao JOTA.

 

As divergências entre Fazenda e contribuintes ocorrem quando se discute se o Carf deve seguir o posicionamento do Supremo no RE 574.706, que definiu a tese geral sobre a temática, ou aplicar entendimentos firmados anteriormente pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). A principal divergência é se, mesmo com a existência dos embargos de declaração na Corte superior, o Carf poderia aplicar o entendimento do STF.

Vitórias dos contribuintes
Nos casos com vitórias aos contribuintes no Carf, os conselheiros consideraram que o precedente do STF já pode ser aplicado pelo tribunal administrativo, apesar dos embargos de declaração.

Em caso julgado em julho de 2018, por maioria de votos, a 1ª Turma da 2ª Câmara da 3ª Seção do Carf deu provimento a um recurso seguindo o entendimento firmado um ano antes no STF. Ou seja, considerou que o ICMS não compõe a base de incidência do PIS e da Cofins. O entendimento consta no acórdão 3201-004.124.

No caso levado ao Carf, a contribuinte questionou decisão da delegacia da Receita Federal em São Paulo que entendeu não ser possível a exclusão do imposto. Para a DRJ, o ICMS seria parte do preço das mercadorias e dos serviços prestados.

A contribuinte alegou que a base de cálculo das contribuições é a receita bruta e “apenas os valores correspondentes ao resultado das atividades é que devem integrar sua base de cálculo, sem a inclusão do ICMS”.

No Carf o caso foi relatado pelo conselheiro Leonardo Toledo de Andrade, que considerou que “um órgão administrativo de julgamento não aplicar o decidido em sede de repercussão geral pelo Supremo Tribunal Federal (STF) quando até mesmo o Superior Tribunal de Justiça ­(STJ) já não mais aplica o seu entendimento em sentido diverso é verdadeira afronta ao julgado pela mais Alta Corte do país”.

Outra vitória dos contribuintes ocorreu no acórdão 3302-006.898. No julgamento realizado na 2ª Turma Ordinária da 3ª Câmara da 3ª Seção o colegiado excluiu o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins por maioria de votos. O relator do processo, conselheiro Walker Araujo, aplicou em sua decisão o entendimento da Solução de Consulta Interna-Cosit 13/2018, que trata sobre o tema.

Segundo o texto do parecer, em julgados sobre a exclusão do ICMS da base de cálculo da Cofins, devem ser observados os seguintes procedimentos: “o montante a ser excluído da base de cálculo mensal da contribuição e o valor mensal do ICMS a recolher, conforme o entendimento majoritário firmado no julgamento do Recurso Extraordinário no 574.706/PR, pelo Supremo Tribunal Federal”.

“Em que se pese inexistir trânsito em julgado da decisão proferida pela Suprema Corte, entendo que se tornou definitiva a matéria quanto ao direito do contribuinte ao menos de excluir da base de cálculo do PIS/COFINS a parcela do ICMS pago ou a recolher, restando àquela Corte apenas decidir se o direito de exclusão será concedido em maior extensão, abrangendo, além do arrecadado, aquele destacado em Notas Fiscais de Saída”, afirmou o relator do processo.

Sobrestamento e diligência
Mais recentemente, a 2ª Turma da 4ª Câmara da 3ª Seção decidiu não aplicar o entendimento do Supremo. O colegiado negou provimento ao recurso por maioria de votos. A ementa do acórdão destaca que o Carf deveria seguir o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.144.469, por meio do qual foi firmada a tese de que “o valor do ICMS, destacado na nota, devido e recolhido pela empresa compõe seu faturamento, submetendo-se à tributação pelas contribuições ao PIS/Pasep e Cofins, sendo integrante também do conceito maior de receita bruta, base de cálculo das referidas exações”.

Segundo os conselheiros, a decisão do Supremo, de outubro de 2017, ainda não é definitiva e, por isso, não é o caso de aplicação obrigatória do precedente ao caso concreto.

A sessão aconteceu em fevereiro de 2019. A contribuinte também havia pedido o sobrestamento do processo até o julgamento do RE 574.706 pelo STF. Porém, o pedido foi rejeitado pelo antigo voto de qualidade.

O relator, conselheiro Waldir Navarro Bezerra, defendeu que os julgadores do conselho administrativo vinculam-se apenas às decisões definitivas de mérito, conforme prevê o artigo 62, §2º do Anexo II do Regimento Interno do Carf. “De forma que, enquanto ela não sobrevenha, o processo administrativo deve ser julgado normalmente em conformidade com a livre convicção do julgador e com os princípios da oficialidade e da presunção de constitucionalidade das leis.”

No mesmo colegiado, em junho de 2019, o julgamento de um recurso foi convertido em diligência para que a unidade de origem identificasse a metodologia usada pelo contribuinte para apurar o valor do crédito e sua liquidez.

No recurso ao Carf, a contribuinte pediu a homologação do pedido de restituição, alegando que valores foram recolhidos indevidamente a título de Cofins após a inclusão do ICMS na base de cálculo. A empresa alega que recolheu R$ 245,6 mil de Cofins, em apuração no período de agosto de 2002. Desse valor, sustenta ter direito ao crédito de R$ 8,3 mil.

A maioria da turma concordou com a relatora, conselheira Cynthia Elena de Campos. Ao analisar o caso, ela entendeu que antes de seguir com o julgamento e aplicar ou não o entendimento firmado pelo STF, seria importante ter esclarecimentos sobre a liquidez do crédito.

“É da contribuinte o ônus da prova passível de contrapor a constatação de utilização dos créditos declarados, apresentando comprovação que possa ao menos demonstrar o direito creditório perseguido e afastar mero erro formal nas informações prestadas em declarações obrigatórias”, afirmou a julgadora, ao determinar a análise da documentação apresentada pela empresa.

A ideia, segundo a relatora, é possibilitar a identificação da metodologia utilizada na apuração da base de cálculo da Cofins, bem como os lançamentos nas contas de ICMS.

Vitórias da Fazenda
Por outro lado, o entendimento mais utilizado nas decisões nas quais a Fazenda é vencedora é pela não aplicação do resultado do julgamento do STF. O resultado costuma ser proferido pelo chamado voto de qualidade, um mecanismo de desempate aplicado pelo presidente da turma, sempre um representante do fisco, que costumava consagrar a Fazenda nos processos. Em 2020, o voto de qualidade foi extinto do Carf pela Lei do Contribuinte Legal (13.988/2020), e casos que envolvem autos de infração passaram a ser decididos a favor do contribuinte em caso de empate na votação.

No acórdão 9303-008.945, por exemplo, a Rhodia Poliamida e Especialidades SA perdeu o processo pelo voto de qualidade na 3ª Turma da Câmara Superior do Carf. O colegiado decidiu que “a parcela relativa ao ICMS, devido sobre operações de venda na condição de contribuinte, inclui-se na base de cálculo das contribuições para o PIS/Pasep e da Cofins”, conforme indica o acórdão do caso.

O voto vencedor, proferido pelo conselheiro Luiz Eduardo de Oliveira Santos assevera “não ser vinculante a decisão do STF esgrimida pela recorrente, por não ter ocorrido trânsito em julgado formal, haja vista estar-se ainda aguardando apreciação de embargos de declaração no RE 574.706/PR”.

A 2ª Turma Ordinária da 4ª Câmara da 3ª Seção também decidiu, em fevereiro de 2019, que o ICMS devido pelo contribuinte sobre operações de venda faz parte da base de cálculo do PIS e da Cofins, “conforme julgamento do STJ no Resp 114.469/PR. Impossibilidade de aplicação da tese firmada pelo STF no RE 574.706 pela ausência de trânsito em julgado”. A decisão foi proferida pelo voto de qualidade.

A base de argumentação da tese vencedora, defendida pelos representantes da Fazenda, foi o acórdão do STJ que estabelece que o ICMS destacado na nota faz parte do faturamento e integra a receita bruta do contribuinte, possibilitando a tributação pelo PIS e pela Cofins. O acórdão do STJ foi usado pela ausência de trânsito em julgado do processo no STF.

Processos mencionados na reportagem:

Acórdão 3201­004.124
Acórdão 3402- 002174
Acórdão 3402-006.283
Acórdão 9303-008.945
Acórdão 3302-006.898
Acórdão 3402-006.217

Fonte: Jota