Intervenção de Lira abre caminho para reforma tributária fatiada de Guedes

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Agora, com a intervenção de Lira, a PEC 45 só pode ser discutida formalmente no plenário da Câmara

A discussão sobre uma fusão ampla de impostos federais, estaduais e municipais foi praticamente inviabilizada no Congresso após a intervenção nos debates feita pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

Lira abriu caminho na Casa para o avanço do plano do ministro Paulo Guedes (Economia), que quer mudanças no sistema tributário de forma fatiada, começando apenas pela fusão dos impostos federais PIS e Cofins.

Agora, as negociações entre governo e aliados preveem que a reforma deve ser repartida em até cinco projetos que serão distribuídos entre Câmara e Senado -que, segundo interlocutores do Palácio do Planalto ouvidos pela reportagem, deu aval ao acordo.

A estratégia de dividir o tema entre diferentes congressistas foi usada anteriormente por governo e aliados.

Em busca de apoio ao Plano Mais Brasil, que buscava reformar regras orçamentárias e rever despesas, foram produzidas três PECs (propostas de emenda à Constituição). O pacotaço lançado pela equipe econômica em 2019 acabou sendo, posteriormente, reunido em apenas um texto que foi aprovado em 2021.

Lira atendeu os interesses do governo na terça-feira (4) ao acabar com a comissão especial da Câmara sobre a reforma tributária, permitindo que a PEC 45, que trata do tema, fique restrita ao plenário.


A decisão foi anunciada somente depois de o relator da comissão mista, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), apresentar seu parecer que contrariava o Executivo.

Aguinaldo formulou o relatório com base na PEC 45 -de autoria do deputado Baleia Rossi (MDB-SP)-, discutida desde 2019 e que propunha uma fusão ampla de impostos (com tributos federais, o estadual ICMS e o municipal ISS), mas alterou o texto e ainda incorporou elementos sugeridos pelo governo e pela PEC 110, do Senado.

Apesar do esforço para conciliar as diferentes propostas, o texto não agradou ao governo por ter incluído na fusão impostos estaduais e municipais.

Guedes era contrário a uma fusão com tal alcance por temer que a União tivesse que arcar com eventuais perdas de estados e municípios ao fim das discussões.

Agora, com a intervenção de Lira, a PEC 45 só pode ser discutida formalmente no plenário da Câmara — o que, pela complexidade do tema, praticamente elimina as chances de ela prosseguir.

Procurados, interlocutores não confirmam que Guedes foi o responsável por pedir a Lira as medidas tomadas na terça -mas dizem que sempre comunicaram a ele a insatisfação com uma reforma ampla.

As discussões baseadas na PEC 45 até podem prosseguir na comissão mista ou no Senado. No entanto, sem apoio do comando da Câmara e do Executivo, as chances de elas prevalecerem são baixas.

Aliados do governo na Câmara dizem que a PEC 45 deve agora ser enterrada. Sem debate na comissão, não há como ajustar o texto conforme o defendido pelos partidos.

Assim, não haveria como costurar maioria favorável à proposta de fusão ampla (federal, estadual e municipal) no plenário. Há décadas se tenta aprovar uma reforma tributária no país, mas nenhum governo conseguiu o feito.


A equipe econômica espera que, agora, a Câmara avance com uma reforma nos moldes defendidos por Guedes.

A ideia é começar pela junção de PIS e Cofins na nova CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços). O projeto de lei sobre o tema já foi enviado pelo Executivo no ano passado.

Lira tem mostrado alinhamento ao governo ao dizer que busca aprovar a reforma tributária que seja possível. "Eu sempre digo: entre o tudo e o nada, eu prefiro o melhor possível. É o que faremos", afirmou nesta semana.

A equipe econômica também quer avançar em uma proposta de unificação da legislação de ICMS e também do ISS, com limitação no número de alíquotas que governadores e prefeitos poderão escolher -evitando a guerra fiscal entre eles e diminuindo a quantidade de diferentes regras tributárias pelo país.

A visão do time de Guedes é que avançar com propostas como essas é uma estratégia mais viável do que uma PEC ampla. A maior parte das mudanças, inclusive a da unificação do ICMS, exigiria proposições mais simples, como projetos de lei -que demandam menos votos.

Outra vontade do governo é avançar com as demais etapas da reforma tributária imaginada por Guedes. Estão nos planos a redução do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica, a taxação de dividendos e a transformação do IPI em um imposto seletivo a itens como cigarros e bebidas.

Em outra frente, o governo quer ampliar as renegociações com devedores, permitindo o pagamento -com desconto- de débitos com a União. Chamado de "passaporte tributário", o projeto visa encerrar discussões judiciais concedendo redução no montante devido por empresas.

Segundo interlocutores do governo no Congresso, projetos que já estão na Câmara e no Senado poderão ser usados para acelerar as votações.


A definição e distribuição das propostas entre os congressistas passam por uma nova negociação também porque as medidas de Lira causaram reação de integrantes da comissão mista -que se encontra em um limbo, porque não foi prorrogada por Lira- da reforma tributária na terça.

O presidente do colegiado, senador Roberto Rocha (PSDB-MA), disse que o objetivo das discussões deve ser esclarecer o debate e criticou a decisão de Lira na terça-feira.

A intervenção do presidente da Câmara na comissão da reforma gerou reações também nesta quarta (5) no Senado.
O senador Angelo Coronel (PSD-BA), que integra o colegiado, defendeu que seja mantida a comissão mista. Para ele, a decisão de Lira é uma oportunidade para o Senado se movimentar e decidir de qual maneira agir.


"Deveria concentrar a reforma tributária em uma comissão mista, para que a gente saia com um parecer, com um projeto palatável para que seja aprovado. Fatiar não é reforma, passa a ser uma minirreforma", disse Coronel.

Da oposição, o senador Rogério Carvalho (PT-SE), também integrante do colegiado misto, disse que se deve aproveitar esse impasse entre Lira e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG).

No dia anterior, Pacheco disse em nota, que "a comissão fez um trabalho longo de aprofundamento sobre a reforma tributária". "É razoável e inteligente darmos oportunidade de concluírem o trabalho."

Carvalho afirmou que agora se abre oportunidade para se discutir uma reforma de caráter progressivo, e não regressivo. "Pelo que acompanhei até agora, é muito mais unificação de tributos, do que reforma tributária. Reforma tributária não deve ter caráter regressivo", disse.


"Agora, com essa disputa, quem sabe a gente não tenha parte da base do governo, que defende os mais ricos, apoiando toda a sociedade brasileira."

As fatias da reforma planejadas por Guedes

  • Unir tributos federais PIS e Cofins na nova CBS. Permitir a adesão de estados de maneira voluntária
  • Incentivar Congresso a aprovar unificação de regras do ICMS e também a do ISS
  • Transformar IPI em um imposto seletivo
  • Reduzir Imposto de Renda de Pessoa Jurídica e taxar dividendos

Fonte: Folha de Pernambuco