Supremo decide que TCU não pode afastar lei que prevê bônus de eficiência

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Supremo decide que TCU não pode afastar lei que prevê bônus de eficiência

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o Tribunal de Contas da União (TCU) não pode proibir o pagamento, previsto em lei, do bônus de eficiência pago aos servidores inativos da Receita Federal. O julgamento virtual encerrou-se nesta segunda-feira (12/4), com placar de oito votos a dois.

Prevaleceu o entendimento do relator, que afirmou ser “inconcebível” que o TCU exerça o controle de constitucionalidade das normas, ou seja, declarar inconstitucional uma lei ou ato normativo do Poder Público. A Corte de Contas, segundo Moraes, é um “órgão técnico de fiscalização contábil, financeira e orçamentária”, cuja competência está definida no artigo 71 da Constituição Federal.

Os ministros discutiram em conjunto o mérito de oito mandados de segurança levados à Corte por sindicatos da Receita Federal e da auditoria-fiscal do Trabalho. As entidades questionavam o fato de o TCU ter considerado inconstitucional o pagamento a inativos porque não incide sobre a parcela o desconto da contribuição para previdência dos servidores.

O bônus é polêmico desde sua criação em 2016 por meio de medida provisória, depois convertida na Lei 13.464/2017. A verba é prevista aos auditores fiscais e aos da carreira tributária e aduaneira de acordo com o alcance das metas de produtividade da Receita Federal. Trechos do dispositivo ampliaram a gratificação, para também ser paga a aposentados e pensionistas, que receberão no mínimo 35% do valor máximo do bônus devido aos servidores ativos.

Um dos pontos em que o TCU se baseou foi a Súmula 347 do STF, editada em 1963, que define que o órgão pode apreciar a constitucionalidade das leis. Moraes discorda. De acordo com o ministro, a “subsistência” da súmula 347 do STF “obviamente, ficou comprometida pela promulgação da Constituição Federal”.

Em liminar de dezembro de 2017, o ministro já havia afastado o entendimento do tribunal de contas. Agora, no Plenário, reafirmou seu posicionamento de que o Supremo tem exclusividade garantida na Constituição para fazer o controle de constitucionalidade das leis e afirmou que, ao afastar a incidência da norma nos casos concretos, o TCU “está retirando totalmente a eficácia da lei, que deixará de produzir efeitos no mundo real”.

Na decisão, o Supremo determina que os processos sejam reanalisados e que o TCU não afaste a incidência da lei na análise de aposentadorias e pensões.

O voto do relator foi seguido pelos ministros Nunes Marques, Ricardo Lewandowski, Luiz Fux, Gilmar Mendes e Cármen Lúcia. Luís Roberto Barroso e Rosa Weber apresentaram pequenas ressalvas quanto à fundamentação. Barroso entende que “todas as autoridades administrativas de nível superior” podem declarar leis inconstitucionais, desde que limitadas ao caso específico analisado. O ministro Dias Toffoli declarou impedimento e não participou da votação.

“Há muito se debate se a súmula 347, de 1963, seria ou não compatível com a nova ordem constitucional. Com essa decisão o debate se encerra, gerando a necessária segurança jurídica”, afirma o advogado Juliano Costa Couto, representante do Sindifisco no caso em conjunto com o ex-ministro Francisco Rezek.

Bônus inconstitucional
Vale destacar o teor dos votos da corrente oposta, em que ficaram vencidos os ministros Luiz Edson Fachin e Marco Aurélio. Eles negaram os pedidos dos sindicatos por entenderem que o TCU deixou de aplicar a lei em caso concreto, o que é permitido.

Foi Fachin quem relembrou que o Supremo reconheceu que “órgãos administrativos autônomos”, entre eles o TCU, podem deixar de aplicar leis que considerem inconstitucionais em caso concreto. O ministro foi além e votou para reconhecer a inconstitucionalidade dos trechos da lei que previam o bônus.

Em longo voto, defendeu a fundamentação da corte de contas de que há violação aos princípios previdenciários do artigo 40 da Constituição (solidariedade, contributividade e equilíbrio financeiro e atuarial).

De acordo com Fachin, o desconto da contribuição previdenciária é um “requisito fundamental para que o servidor possa perceber verbas na inatividade, a título de proventos de aposentadoria ou de pensão” – o que não é previsto na Lei 13.464/2017.

“O servidor público somente pode carrear à inatividade verbas sobre as quais tenha efetivamente contribuído, especialmente em se considerando que muitos deles não possuem paridade em relação aos servidores em atividade”, afirmou.

A constitucionalidade da bonificação é alvo de ação que será analisada pelo Plenário da Corte e está sob relatoria do ministro Gilmar Mendes. A ADI 6.562 foi ajuizada pelo procurador-geral da República (PGR) em outubro de 2020.

TCU x Receita Federal
As decisões do TCU em relação ao bônus de eficiência pago aos auditores fiscais têm como pano de fundo um conflito antigo da Corte de Contas com o órgão responsável pela administração tributária.

O Tribunal tem encontrado, desde a década de 90, uma série de dificuldades quando vai auditar a Receita, sobretudo os dados de arrecadação, principalmente porque o órgão argumenta que as informações que detêm são cobertas por sigilo fiscal – e nem mesmo o TCU poderia obtê-las.

Em 2019, quando julgou as contas do último ano da gestão de Michel Temer (PMDB), por exemplo, os ministros alertaram o governo Bolsonaro sobre a falta de transparência do órgão, à época comandado pelo ex-secretário Marcos Cintra.

Em maio daquele ano o TCU chegou a um acordo com o ministro da Economia, Paulo Guedes, para que passasse a auditar a Receita Federal. Pela primeira vez, o órgão concordou em abrir seus dados para os auditores de controle externo.

Ainda assim, no mesmo ano, o tribunal voltou a contestar o pagamento do bônus aos auditores: na ocasião, em processo do ministro Bruno Dantas, o plenário deu um prazo de 30 dias para que o governo federal regularizasse o bônus de eficiência. A medida provisória que regulamentou o pagamento foi editada em março de 2020.

Na ocasião, os técnicos da Corte estimaram que o Executivo havia desembolsado R$ 2,5 bilhões com o bônus desde 2017, de forma irregular, já que não havia previsão orçamentária para essa despesa.

Apesar dos questionamentos ao bônus de eficiência, auditores e ministros da Corte avaliam que, após o acordo firmado com a Receita, o Tribunal conseguirá avançar nas fiscalizações sobre o órgão responsável pela administração tributária.

O ano de 2021, por exemplo, será o primeiro que o TCU poderá analisar todo o processo de administração tributária, principalmente a arrecadação e a fiscalização. Com o acordo firmado com o Executivo, o TCU criou uma secretaria que cuidará especificamente da Receita Federal.

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Processos analisados pelo STF citado na matéria: MS 35.410, 35.490, 35.494, 35.498, 35.500, 35.836, 35.812 e 35.824

Fonte: Jota