Bolsonaro critica presidente da Petrobras por reajustes de preços

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Presidente disse ainda que vai zerar imposto federal para diesel e gás de cozinha

Irritado com um novo aumento no preço dos combustíveis pela Petrobras, o presidente Jair Bolsonaro criticou o presidente da companhia, Roberto Castello Branco, e disse que, embora não possa e “nem iria interferir” na empresa, “alguma coisa vai acontecer na Petrobras nos próximos dias”. Ele também anunciou que, a partir de 1 de março, o governo irá zerar os impostos federais incidentes no diesel e no gás de cozinha. Nas últimas semanas, a estatal anunciou aumentos de 15,2% para o diesel e de 10,2% para a gasolina.

Bolsonaro criticou a atuação da Receita Federal e da Agência Nacional do Petróleo, dizendo que "ninguém dá bola para nada", e abordou na sequência o caso da estatal. "Você vai em cima da Petrobras e ela fala: 'Opa, não é obrigação minha'. Ou como disse o presidente da Petrobras há poucos dias: 'Eu não tenho nada a ver com caminhoneiro. Eu aumento o preço aqui e não tenho nada a ver com caminhoneiro'. Foi o que ele falou, o presidente da Petrobras. Isso vai ter uma consequência, obviamente", afirmou, em transmissão nas redes sociais, chamando o reajuste de "excessivo" e "fora da curva".

No caso do diesel, a suspensão de imposto federal valerá por dois meses. Segundo Bolsonaro, a perda de receita anual seria de R$ 26,9 bilhões. Já o ministro Guedes estimou em menos R$ 20,1 bilhões. Se for por dois meses seria de R$ 3 bilhões. Do gás, a tributação será zerada "ad aeternum", segundo o presidente.

Nos últimos dias, resistente em aceitar as alternativas da equipe econômica para compensar a perda de arrecadação, Bolsonaro chegou a sugerir que houvesse exceção nas exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) em momentos de calamidade para permitir a redução de impostos sem que se aponte outra fonte de receita. Na "live" de ontem, porém, ele não voltou no assunto.

"Neste período, vamos estudar maneira definitiva de zerar este imposto [PIS/Cofins do diesel]", explicou o presidente. "Isso vai contrabalancear este aumento excessivo da Petrobras, mas eu não posso interferir, nem iria interferir [na estatal]. Se bem que alguma coisa vai acontecer na Petrobras nos próximos dias. Você tem que mudar alguma coisa, vai acontecer", complementou.

A decisão foi tomada em reunião com o ministro da Economia, Paulo Guedes, durante a tarde. Ainda de acordo com o presidente, o reajuste anunciado pela estatal - de 10% sobre gasolina e 15% no diesel - segue os preços internacionais e não depende dele. "A bronca vem sempre para cima de mim, só que a Petrobras tem autonomia. Petrobras tem garantia e autonomia para aumentar os combustíveis", reclamou.

O presidente também defendeu que a solução definitiva sobre o preço dos combustíveis dependerá da analise do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) sobre o ICMS, que é cobrado pelos Estados. Um projeto enviado pelo Planalto ao Congresso prevê revisão do imposto. "O Confaz vai decidir [sobre tributação de combustíveis nos Estados], acho que poderia dizer um valor máximo para o ICMS. Parece que quanto mais pobre é o Estado maior é o imposto de combustíveis."

Preocupado em dar uma satisfação aos caminhoneiros, Bolsonaro levou em sua transmissão o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, principal interlocutor do governo com a categoria. O ministro garantiu que sua pasta estuda uma série de medidas para tornar “mais fácil” o trabalho dos motoristas.

“Nós temos o próprio estudo da questão do combustível em si, que está sendo levado em consideração, então tem algumas alternativas para amortecer essa volatilidade que vem do mercado externo. Então nós estamos trabalhando todas as possibilidades para tornar o custo do transporte menor, e a vida do nosso profissional do volante, sobretudo, mais fácil.”

As declarações de Bolsonaro e do ministro da Infraestrutura ocorreram pouco tempo depois de a Associação Brasileira dos Condutores de Veículos Automotores (Abrava) criticar os reajustes. “O que nos faz questionar onde está a palavra do governo federal que na pessoa do presidente da República sinalizou a diminuição dos impostos federais dos combustíveis e vamos para o quarto aumento consecutivo em menos de trinta dias se mantendo inerte e nada fez de concreto até o presente momento”, disse nota o presidente da entidade, Wallace Landim.

Na nota, ele lembra que a associação solicitou a Guedes a redução a zero dos tributos federais sobre combustíveis no dia 26 de janeiro. O pedido teve por base o desafio lançado por Bolsonaro, de zerar a tributação se os governadores fizessem o mesmo. “Precisamos que o presidente da República dê a devida atenção a esta questão, com medidas efetivas e não apenas promessas vazias e sem nenhum cumprimento, afinal a nação está sofrendo as consequências das frequentes altas no preço do combustível”, aponta o documento, divulgado antes da transmissão de Bolsonaro nas redes sociais.

Para Marcelo Mesquita, sócio-fundador da Leblon Equities e conselheiro eleito pelos minoritários na Petrobras, é o “fim da picada” ver essa discussão pública com “frases enigmáticas que só geram volatilidade e tensão no mercado, e aumentam o risco Brasil e o dólar”.

Ele explica que hoje existem restrições a tentativas de interferência política na estatal, mas esse tipo de ruído pesa em toda a gestão pública das estatais listadas em bolsa.

“Não adianta se eleger e dizer que vai fazer diferente do PT, mas fazer tudo igual. Isso é estelionato eleitoral”, afirma o profissional. Para ele, esse tipo de debate relembra interferências políticas na Petrobras em gestões anteriores, algo que trava o desenvolvimento do país. “Não conseguimos avançar se discutimos os mesmos temas depois de ter aprendido lições do passado. É o fim da picada ver essa discussão pública”, diz.

Para o executivo, a declaração de Bolsonaro é “enigmática e desnecessária”, já que o presidente deveria estar tentando reduzir impostos e diminuir o tamanho do Estado. “São comentários que dificultam a gestão da política econômica, da Petrobras e de todas as estatais”, diz.“Uma pessoa que tem poder não pode ficar vociferando coisas assim. As declarações geram volatilidade, geram dificuldade para o ambiente de negócios no país. E são só comentários, não temos fatos”, explica. “Todas as commodities estão caras no Brasil e não é só o câmbio. Os impostos são muito altos. Precisamos de uma reforma administrativa e tributária urgente para reduzir o custo do Estado e aumentar a eficiência do país”, diz. “Não é no grito que vamos arrumar o país. A interferência na Petrobras não vai acontecer de novo. Temos investidores atentos aqui no Brasil, em Nova York e no mun do todo de olhos abertos. E temos os reguladores também bem atentos SEC, DoJ, CVM, TCU, MP, Cade, ANP etc.”, diz.

“Mesmo que o presidente troque as pessoas, o CEO etc., a lei é a lei e não será fácil achar pessoas ilibadas e qualificadas dispostas a fazer um papel errado na empresa. As instituições são mais fortes do que as pessoas e a empresa vai resistir com a lei a qualquer interferência, se houver. Até hoje felizmente ainda não houve interferência, apenas toda esta gritaria incompreensível”. Em outros momentos da live de ontem, Bolsonaro ainda rebateu comentários de internautas sobre mais assuntos, mas evitou comentar a situação do deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ), seu apoiador , que foi preso por determinação do Supremo Tribunal Federal no âmbito do processo dos atos antidemocráticos. (Colaboraram Edna Simão, Fabio Graner, de Brasília)

Fonte: Valor Econômico