Carf isenta de IRPF resgaste previdenciário por portador de moléstia grave

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Colegiado seguiu decisões do STJ. Conselheiros alteraram votos após a PGFN definir a não contestação do tema

O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), por unanimidade de votos, decidiu que não incide Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) sobre resgates de previdência privada complementar por contribuinte portador de moléstia grave. O processo foi julgado pela 2ª Turma da Câmara Superior, última instância do tribunal administrativo, no dia 18 de novembro.

O caso teve quatro mudanças de votos por conta de um despacho publicado pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) que recomenda a não apresentação de contestação em relação a diversos temas tributários, inclusive a tributação de resgates por portadores de moléstia grave. Com a decisão, o Carf se alinha ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), que também entende pela isenção de IRPF.

O caso retornou de vista de sessão realizada em outubro. Com o resultado, a turma manteve a decisão proferida em março de 2019 pela 2ª Turma Ordinária da 4ª Câmara da 2ª Seção.

No início da sessão, o contribuinte contava com quatro votos contra a isenção do IRPF e com possibilidade de ter o quinto voto contrário, já que a conselheira que pediu vista, Rita Eliza Reis Da Costa Bacchieri, representante dos contribuintes, também costuma votar pela impossibilidade de isenção, conforme explicou. Somente o relator, conselheiro João Victor Ribeiro Aldinucci, tinha votado pela possibilidade de isenção.


Entretanto, o relator afirmou, ao fazer o resumo do caso, que acrescentou novos argumentos ao seu voto, fato que mudou o posicionamento de uma conselheira do colegiado, Ana Cecília Lustosa, que tinha votado a favor da Fazenda, e fez a julgadora Rita Bacchieri também votar contra a Fazenda Nacional.

O argumento utilizado pelo relator foi que entre o julgamento na última sessão da turma, em outubro, e o debate do caso em novembro, a PGFN publicou o despacho 348/2020, que estabeleceu uma série de temas sobre os quais o órgão não apresentaria mais recurso. A isenção de IRPF sobre resgates de previdência privada complementar por portadores de moléstia grave foi um deles.

Além disso, o relator mencionou a Nota SEI 50/2018, também publicada pela PGFN, que reconheceu que a norma de isenção do IRPF também abrange o resgate de contribuições de previdência complementar em caso de portador de moléstia grave.

Ademais, o julgador reiterou que existe uma jurisprudência no Superior Tribunal de Justiça (STJ) a favor da isenção do IRPF sobre os resgates de previdência privada complementar, com acórdãos proferidos pela Primeira e pela Segunda turma.

Mudança de votos
A conselheira Rita Bacchieri, representante dos contribuintes, foi a primeira a expor o voto a favor do contribuinte após o relator. “Entendia que os resgates não estariam abrangidos pela regra da isenção, mas a posição atual é que, no sentido de reconhecer a jurisprudência do STJ, e diante da manifestação da própria PGFN, nos cabe acompanhar esse entendimento”, explicou.

Em seguida a conselheira Ana Cecília, conselheira dos contribuintes, alterou o voto em relação à sessão anterior. A mudança ocorreu, segundo a julgadora, por conta da manifestação da PGFN sobre o tema. A julgadora também tinha o posicionamento contrário à possibilidade de isenção do IRPF.

Conselheiros da Fazenda
Em um primeiro momento os conselheiros da Fazenda anunciaram que manteriam os votos para não permitir a isenção do IRPF. O principal argumento utilizado foi que o voto do relator mencionava o resgate “antecipado” de previdência privada complementar.

“Me parece que o que aconteceu no caso em debate foi o resgate antecipado. Isso não está abrangido na manifestação da PGFN e na jurisprudência do STJ”, explicou o conselheiro Mário Pereira de Pinho Filho. Ele acrescentou que existem dois tipos de resgate: o antecipado e o que acontece no final do contrato de previdência, que teria a isenção de IRPF.

Entretanto, o relator do processo afirmou que o seu voto precisaria de uma alteração para a retirada da palavra “antecipada”, já que, segundo os autos do processo, a situação não indicava que de fato ocorreu um resgate antecipado.

“É um resgaste sem ser antecipado. O contribuinte já era aposentado militar e, além disso, portador de moléstia grave”, explicou o relator ao alterar o trecho do seu voto. Com isso, foi iniciada uma nova discussão e os três conselheiros da Fazenda que tinham votado contra a isenção mudaram os seus posicionamentos.

“Altero meu voto, considerando que o resgate se deu ao final do contrato de previdência privada”, afirmou o conselheiro Mário Pereira de Pinho Filho. Ele foi acompanhado pelos outros representantes da Fazenda: Maurício Nogueira Righetti, Pedro Paulo Pereira Barbosa e Maria Helena Cotta Cardozo.

Jurisprudência
Apesar de o tema ser considerado novo no Carf, conforme conselheiros afirmaram ao JOTA, o STJ já proferiu uma série de decisões sobre o assunto, formando uma jurisprudência a favor da isenção do IRPF no resgate previdenciário por portador de moléstia grave. Ainda não existe repetitivo sobre o tema.

O entendimento das turmas é que o resgate não afasta a natureza previdenciária do saldo existente. De relatoria do ministro Gurgel de Faria, o REsp 1554683/ PR, por exemplo, conheceu a possibilidade de isenção. “O art. 33 da Lei n. 9.250/1995 dispôs que ‘sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte e na declaração de ajuste anual os benefícios recebidos de entidade de previdência privada, bem como as importâncias correspondentes ao resgate de contribuições’”, definiu o magistrado. O caso, julgado pela Primeira Turma, envolveu a Fazenda Nacional e o contribuinte Antonio Carlos Schwertner. A votação foi unânime.

O mesmo entendimento foi proferido pela Segunda Turma no REsp 1662097/RS, de relatoria do ministro Mauro Campbell Marques, no REsp 1507320/RS, de relatoria do ministro Humberto Martins, e no REsp 1204516/PR, de relatoria do ex-ministro Castro Meira.

Ademais, há uma série de decisões monocráticas na Corte Superior com o mesmo entendimento. No Carf, a maior parte da jurisprudência sobre o tema está nas turmas ordinárias. Os entendimentos são para que o portador de moléstia grave seja beneficiado da isenção desde que exista um laudo médico oficial.

Os julgados também limitam a isenção aos rendimentos recebidos “a partir da data em que a doença for contraída, quando identificada no laudo pericial”, conforme assevera o acórdão do processo 11080.000185/2009-72, julgado em 2019, na 2ª Turma Ordinária da 4ª Câmara da 2ª Seção.

Outra decisão, dessa vez proferida pela 2ª Turma Ordinária da 2ª Câmara da 2ª Seção em setembro, entendeu que o resgate da complementação de aposentadoria por portador de moléstia grave está isento do IRPF, “sob o entendimento de que o resgate, de Contribuições à Previdência Privada, Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL) e aos Fundos de Aposentadoria Programada Individual (FAPI), não descaracteriza a natureza jurídica previdenciária da verba”.

Fonte: Jota