Gerdau está a um voto de vencer julgamento sobre ágio interno

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Autuação de R$ 367 milhões é analisada pela 2ª Turma do TRF da 4ª Região

A Gerdau Aços Especiais está a um voto de vencer disputa com a Fazenda Nacional no Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, com sede em Porto Alegre. Há, por enquanto, dois dos três votos necessários para cancelar a autuação fiscal por uso indevido de ágio gerado a partir de reorganização societária entre 2004 e 2005.

O julgamento é importante para os contribuintes e, segundo advogados, poderá ser o primeiro resultado favorável no TRF da 4ª Região sobre ágio interno - dentro do mesmo grupo econômico. Em caso anterior sobre o tema, o TRF manteve parte da autuação sobre ágio interno, em 2015, contra o grupo Dass, fabricante de calçados (processo nº 5004003-95.2014.404.7202).

Já o processo envolvendo a Todeschini, em que o contribuinte perdeu, especialistas não o consideram como precedente sobre ágio interno porque houve aquisição de empresa fora do grupo (processo nº 5005789-24.2012.4.04.7113).

No TRF da 3ª Região, com sede em São Paulo, há duas decisões desfavoráveis, uma delas envolve a Viação Cometa, que já recorreu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Nesse caso (processo nº 0027143-60.20 09.4. 03.6100), os desembargadores entenderam que a operação de ágio interno estaria vedada legalmente, com base em normas do Conselho Federal de Contabilidade e da Comissão de Valores Mobiliários.

A outra decisão, de 2014, tem como parte o Grupo Libra. Advogados, porém, não a consideram como precedente negativo, por envolver argumentos diferentes dos atuais (processo nº 00172372.2010.4.03.6100).

O ágio consiste em um valor pago, em geral, pela rentabilidade futura de uma empresa adquirida ou incorporada. Pode ser registrado como despesa no balanço e amortizado para reduzir o valor do Imposto de Renda e CSLL a pagar. Contudo, a Receita Federal autua contribuintes quando interpreta que uma operação entre empresas foi realizada apenas para reduzir tributos.

O processo da Gerdau (nº 5058075-42.2017.4.04.7100) envolve uma autuação de R$ 367 milhões. A Receita cobra Imposto de Renda e CSLL. A companhia levou o embate à Justiça após perder na Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), em 2016, por voto de qualidade - desempate pelo representante da Fazenda. Em 2018, obteve sentença favorável na 16ª Vara Federal de Porto Alegre.

A amortização do chamado ágio interno foi feita no período de setembro de 2005 a junho de 2010, depois de aporte de capital social ocorrido em uma sequência de operações de reorganização societária, iniciadas em 2004. As mudanças geraram autuações fiscais, inclusive contra outras controladas da Gerdau. Para a empresa, foram operações regulares, que geraram ágio em razão de cisão da Gerdau Açominas.

O caso começou a ser julgado no TRF em sessão telepresencial em 29 de setembro. O relator na 2ª Turma, juiz federal convocado Alexandre Rossato da Silva Ávila, disse em seu voto que as operações societárias que deram origem ao “ágio interno”, glosado pela fiscalização, ocorreram antes da Lei nº 11.638, de 2007.

A norma, complementada pela Lei nº 11.941, de 2009, promoveu alterações na Lei das Sociedades Anônimas (nº 6.404, de 1976) ao instituir novos critérios para determinar a avaliação dos investimentos e seus respectivos registros contábeis, sobretudo e coligadas e controladas.

Segundo o magistrado “até então, não havia tratamento tributário e contábil específico para o ágio resultante de operações entre empresas pertencentes ao mesmo grupo econômico”. Em decorrência das alterações, houve a edição do Ofício Circular da CVM nº 1, de 2007, disciplinando o ágio interno, e a Orientação Técnica OCPC nº 2, de 2008, do Comitê de Pronunciamentos Contábeis, que tratou do assunto.

O juiz ressaltou que a Lei n° 12.973, de 2014, que proibiu a amortização do ágio nas operações de incorporação, fusão ou cisão é posterior à operação. “Ocorre que, quando os referidos ágios foram registrados pelos contribuintes, nem a contabilidade nem o direito proibiam o seu registro”, disse. O entendimento do relator foi seguido pela desembargadora Maria de Fátima Freitas Labarrére. O julgamento foi suspenso por pedido de vista do desembargador Rômulo Pizzolatti.

Além da Gerdau Aços Especiais, a Gerdau Aços Longos e a Gerdau Açominas foram autuadas pela mesma operação. Pelo menos quatro cobranças foram mantidas pela Câmara Superior em 2016.

A Gerdau Aços Longos já teve sentença favorável na 11ª Vara Federal de Execução Fiscal do Rio de Janeiro para anular dois autos de infração pelo uso de ágio da mesma reorganização societária do grupo de 2004. Ao analisar o processo, o juiz Silvio Wanderley do Nascimento Lima entendeu que não havia “qualquer irregularidade” na reestruturação societária do grupo de 2004. Ao analisar o processo, o juiz Silvio Wanderley do Nascimento Lima entendeu que não havia “qualquer irregularidade” na reestruturação societária (processo nº 0143649-58.2017.4.02.5101).

O valor das autuações chega a R$ 5 bilhões, segundo o Formulário de Referência da Gerdau de 2017. Parte das decisões obtidas no Carf nesses processos chegaram a ser incluídos na Operação Zelotes e estão sendo investigados para apurar supostos atos ilícitos.

Para o advogado Maurício Faro, sócio do BMA Advogados, o voto do relator foi além da sentença, que havia entendido que na época da operação não existia vedação em lei para o aproveitamento do ágio interno. “É um voto importante e traz equilíbrio ao reconhecer, sobretudo, o fundamento jurídico que levou ao planejamento tributário”, diz.

Diego Miguita, sócio de VBSO Advogados, considera que o voto do relator não poderia estar mais acertado e coerente com a legislação tributária vigente na época. “É precisamente o entendimento que deverá prevalecer no Judiciário, abordando detalhadamente o contexto histórico que induziu a construção da legislação tributária atual”, afirma.

Nunca houve antes da Lei nº 12.973, de 2014, diz Miguita, restrição sobre ágio decorrente de operações entre partes que mantinham alguma relação societária.

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informa que a questão não está definida, diante do pedido de vista do desembargador Pizzolatti. Caso ele vote a favor da União, afirma o órgão, haverá novo julgamento pela turma ampliada. A Gerdau, por nota, diz que “aguarda, com o respeito de sempre, o pronunciamento final do TRF-4.

 

Fonte: Valor Econômico