Prefeitos decidem se e quando se acoplar no imposto único, diz Guedes

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Para o ministro da Economia, o Congresso não deve impor a unificação do ICMS e ISS na reforma tributária

Cada prefeito vai decidir se quer aderir ao imposto único sobre bens e serviços, disse nesta segunda-feira o ministro da Economia, Paulo Guedes, durante o webinário “A visão municipalista da reforma tributária”, promovido pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM).

Ele explicava a proposta do governo federal, de criar um imposto sobre valor agregado (IVA) dual, começando com a parte federal e “acoplando” Estados e municípios ao longo do tempo. Guedes deixou claro que a “acoplagem” será decisão de cada prefeito.

“Criamos o nosso IVA Dual para acoplar os Estados e olhamos os municípios com muita compreensão”, disse. “Seria muito bom que estivéssemos todos num imposto único [sobre bens e serviços].” No entanto, acrescentou, o governo apoiará a decisão dos prefeitos.

O Ministro da Economia, Paulo Guedes, acredita que a competição entre as cidades levará os prefeitos a buscar se acoplar no IVA — Foto: Jorge William/Agência O GloboO Ministro da Economia, Paulo Guedes, acredita que a competição entre as cidades levará os prefeitos a buscar se acoplar no IVA .

“O prefeito decide se e quando quer vir para acoplar no projeto de um imposto único que nós apoiamos, achamos eficiente e bom para o futuro do país”, informou. “Mas não podemos impor aos prefeitos, exatamente por essa nossa convicção da independência dos municípios.”

Guedes ressalvou que o Congresso Nacional, que analisa uma proposta de reforma tributária, pode ter um olhar diferente desse que ele descreveu.

Ele acrescentou que defende o IVA Dual desde a campanha e espera o acoplamento dos entes subnacionais à proposta. “Principalmente nos municípios, que têm base [arrecadatória] de propriedade e também sobre serviços, que é uma base crescente”, disse. “A economia mundial é cada vez mais uma base de serviços.”

É natural que os Estados, que tem o ICMS, que incide sobre produtos, procurem base mais ampla, comentou. Mas é preciso olhar para os municípios nesse tema. “É uma discussão complexa, não é rápida, não é coisa de se liquidar em 30 dias”, disse. “É uma discussão sobre todo o pacto federativo.”

O pacto federativo, disse, tem várias dimensões. Uma é a reforma tributária, outra é o próprio pacto e outra é como reparar o balanço da União.

“A União se endivida muito, cada vez que atende os Estados como agora na pandemia, e ao mesmo tempo está sobrecarregada porque, existindo o teto de gastos, que é âncora fiscal importante”, disse.

O teto, explicou, impede que o Estado continue asfixiando a sociedade. “Se você tem teto, mas não tiver as paredes, que são as reformas, o teto cai”, disse. “E se o chão sobe, porque as despesas obrigatórias estão desindexadas, é questão de tempo para furar o teto também.”

Por isso, afirmou, é um “ato de coragem da classe política” desvincular os orçamentos públicos. O pacto federativo contempla a desindexação das despesas, a desvinculação das receitas e desobrigações de gastos.

“Tivemos na pandemia duas lições extraordinárias do poder de decisão da classe política”, elogiou. Ele questionou se a saúde brasileira estaria protegida pela indexação de gastos, e respondeu que não. “Quem deu a resposta foi justamente o governo e a classe política”, afirmou, referindo-se à mobilização para elevar os gastos no enfrentamento da enfrentamento da crise. “Está provado que a indexação não protege ninguém.”

Competição
Guedes defendeu que o Congresso não deve impor a unificação do ICMS e ISS na reforma tributária, mas que a competição entre as cidades levará a decisão de aderirem ao IVA Dual proposto pelo governo federal com a unificação, num primeiro momento, apenas de impostos federais (PIS e Cofins).

O ministro citou o caso de Juiz de Fora (MG), “que já foi considerada a Manchester brasileira quando os impostos eram poucos e simples, mas se esvaziou [de indústrias] com a criação de um manicômio tributário”.

Na opinião dele, a cidade poderá se sentir estimulada a acoplar seu ISS no IVA Dual proposto pelo governo e, com isso, ganharia competitividade para voltar a atrair indústrias. Já Belo Horizonte, que é contra a unificação por contar com uma arrecadação expressiva de ISS, ficaria entre a decisão de manter seu imposto, pensando nos serviços, ou unificar pelas indústrias.

“Ora, disparamos corrida virtuosa em direção ao imposto único, porque começou uma desconcentração industrial. Juiz de Fora começou a receber indústrias de novo e Belo Horizonte pensará duas vezes se quer ficar com o ISS ou se quer se juntar [ao IVA Dual] para não perder as indústrias”, disse Guedes.

Guedes deu como exemplo – “uma suposição” – que a distribuição da arrecadação seria de 10% para a União, 10% para o Estado de Minas Gerais e 2% para Juiz de Fora. Se as grandes cidades de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro decidirem aderir ao IVA Dual para manterem suas indústrias, disse, o resto do Brasil aderirá também ao imposto unificado.

O ministro voltou a se posicionar contra a criação de um fundo de compensação para impedir que os entes federativos percam arrecadação no curto prazo, dizendo que não há mais dinheiro e que isso estará “assaltando” as futuras gerações. “É a mesma discussão da covid. [Dizem] Ah, a União se endivida e assume. Mas a União já está muito endividada”, afirmou.

O governo tinha R$ 300 bilhões para distribuir com Estados e municípios, mas já gastou R$ 250 bilhões [em dez anos] com o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) e R$ 50 bilhões com a repactuação da Lei Kandir.

“Se não temos esses recursos, não podemos bancar. Já dividimos o que tínhamos e nos endividamos bastante durante a pandemia. Não temos condições de duplicar a dose agora”, reforçou.

Guedes prometeu dividir todos os recursos obtidos pelo governo federal com concessões e leilões de petróleo, mas destacou que a covid-19 provocou um desastre na arrecadação tributária. Ele disse acreditar que a arrecadação de impostos não vai cair mais daqui para a frente e voltará a subir, mas que não pode comprometer uma receita que não sabe se existirá. “Somos federalistas, queremos descentralização, mas sempre com responsabilidade fiscal, sem açodamento. A União não é um saco sem fundo”, repetiu.

O anúncio de criação de um fundo de equalização que custaria entre “2%, 4% ou 6%” do Produto Interno Bruto (PIB) levará o Brasil a uma situação dramática, disse. “A União pode quebrar. Vamos entrar numa rota de implosão fiscal. Estamos fazendo todo nosso esforço à beira de um vulcão”, alardeou.

Por causa de tudo isso, reforçou Guedes, é preciso discutir por mais tempo a reforma tributária, para debater também sobre o pacto federativo, e questionou “se é possível fazer isso em 30 ou 60 dias” – prazo planejado pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e a comissão da reforma tributária no Congresso para votar a reforma tributária ainda este ano.

Divergências
O presidente da Confederação Nacional de Municípios (CNM), Glademir Aroldi, discordou do ministro da Economia, Paulo Guedes, que defendeu uma reforma tributária em fases, e disse que o ICMS é também um imposto municipal, por ter a arrecadação compartilhada com as cidades, e, portanto, a opinião dos prefeitos também deve ser levada em conta nesse debate.

Aroldi disse que isso preocupa os prefeitos porque o ICMS, por ter parte da arrecadação compartilhada com as cidades, é considerado por eles também um imposto municipal.

Aroldi é um dos defensores da criação de um fundo para evitar perdas na arrecadação das prefeituras, mas não disse isso após a fala do ministro, adotando um discurso de convergência. “Entendo que, a União quebrando, a União em dificuldade, os Estados e municípios sofrerão da mesma forma. Precisamos de uma reforma que olhe a todos”, comentou.

Para o presidente da CNM, entidade que representa as pequenas e médias cidades, o governo e os prefeitos estão “mais ou menos bem alinhados” na defesa de uma reforma com justiça tributária, simplificação e responsabilidade com as gerações futuras.

Ele defendeu que o ISS é um imposto cuja arrecadação está concentrada, com 39 cidades recebendo 69% de toda a arrecadação, e que um projeto aprovado recentemente pelo Senado para descentralizar a tributação de cartões de crédito e planos de saúde deve “corrigir essa injustiça”.

Dois pontos de convergência, segundo Aroldi, são que não deve haver aumento da carga tributária e que o comitê gestor do novo imposto, se for o imposto sobre bens e serviços único, tenha participação paritária de prefeitos e governadores.

Em sua apresentação, Guedes voltou a repetir que a reforma não trará aumento da carga tributária. Segundo ele, a proposta é simplificar e reduzir algumas alíquotas, como, por exemplo, para as empresas que criam empregos e que inovam. A diminuição viria acompanhada, diz ele, de um aumento da tributação sobre dividendos.

Fonte: Valor Econômico