Embargos definirão ICMS sobre PIS e Cofins

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Mais de uma década após entrar com uma ação que pede a exclusão do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) na base de cálculo do Programa de Integração Social (PIS)...

Mais de uma década após entrar com uma ação que pede a exclusão do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) na base de cálculo do Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), a Imcopa Importação, Exportação e Indústria de Óleos obteve uma vitória que representa mais de 10 mil empresas que questionavam a cobrança e aguardavam julgamento.

Ao dar ganho de causa à companhia paranaense, que foi representada pelo escritório gaúcho Nagelstein Advogados, o Supremo Tribunal Federal (STF) abre um precedente que permite aos contribuintes pessoas jurídicas requererem a restituição de valores pagos indevidamente entre 2003 e 2014, o que representaria uma perda superior a R$ 250 bilhões aos cofres públicos.

Além disso, a União deixaria de arrecadar R$ 27 bilhões por ano, de acordo com cálculos apresentados pela Advocacia-Geral da União (AGU). Embora o Ministério da Fazenda alegue que os impactos da redução da base de cálculo do PIS/Cofins só possam ser conhecidos depois que o STF publicar os embargos declaratórios e definir quando a mudança entrará em vigor, as possíveis perdas preocupam o governo federal, que decidiu contestar os efeitos da medida.

Assim, mesmo que o STF tenha votado a favor da medida em sessão no dia 15 de março, os ministros devem julgar ainda os recursos que serão apresentados pela União. "Esperamos que, antes do fim deste ano, isso aconteça", afirma Paulo Henrique Nagelstein, advogado tributarista e um dos autores do processo que deu origem à decisão do STF.

O argumento apresentado na ação do Nagelstein Advogados é que o ICMS não é incorporado ao patrimônio da empresa, mas, sim, apenas um trânsito contábil. "Não há ingresso de recursos financeiros em caixa, uma vez que o montante é totalmente repassado para o Fisco estadual", pontua Nagesltein, ao explicar que isso não constitui faturamento.

O Recurso Extraordinário (RE) nº 574.706, apresentado pelo escritório gaúcho em 2006, tornou-se caso líder, termo que define juridicamente o processo que dá origem ao julgamento de um tema e representa os demais. Agora, a preocupação é quanto a duas questões destacadas no julgamento, diz o advogado. A primeira diz respeito ao impacto financeiro da interpretação dada pela Suprema Corte aos cofres federais. "Como já houve recurso da União nesse sentido, há uma grande preocupação quanto ao que o STF irá fazer", argumenta.

As contestações do governo federal também podem representar diferentes modulações dos efeitos da medida, de forma a restringir o número de empresas que possam se beneficiar da mudança. "Uma das possibilidades é contemplar apenas quem ingressou com ação até o trânsito em julgado da matéria", exemplifica. Assim, ficariam de fora todas as empresas que não tenham recorrido até a decisão judicial final sobre a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins.

Outra alternativa cogitada é que a aprovação pelo STF só produza efeitos a partir de 2018, o que faria com que as empresas seguissem pagando PIS e Cofins com a incidência de ICMS até o fim deste ano. Essas são apenas algumas das hipóteses do que pode ocorrer caso sejam criadas barreiras para limitar o acesso à decisão. "As empresas precisam ficar atentas às próximas resoluções, porque certamente irão impactar o regime de incidência dos tributos", destaca o advogado, reforçando que, independentemente da modulação dos efeitos, representa uma vitória do contribuinte.

Governo federal tenta adiar os possíveis efeitos da decisão

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) usará como base do recurso contra a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que excluiu o ICMS da base de cálculo do PIS/Cofins o argumento de que o caminho natural para a União compensar as perdas de arrecadação é a elevação da alíquota e que, para isso, precisa de algum tempo.

O procurador-geral da Fazenda Nacional, Fabrício da Soller, disse que pedirá que a medida só tenha efeito a partir de 2018. "Como a decisão implica redução da base de cálculo, resta ao Fisco aumentar a alíquota para compensar. É a forma natural, mas isso tem que ter um prazo", afirmou. Também será analisado se cabem outros argumentos, inclusive um pedido de revisão da decisão do dia 15 de março.

O Ministério da Fazenda diz que não há decisão sobre aumento da alíquota de PIS/Confins para compensar possíveis perdas de arrecadação. De acordo com a pasta, é preciso aguardar o julgamento do recurso que será apresentado ao STF, quando, então, o ministro Henrique Meirelles decidirá sobre o aumento da alíquota e levará o assunto ao presidente Michel Temer.

Soller disse que não há nenhum efeito imediato da decisão, ou seja, o governo continuará fazendo a cobrança do tributo como é feito até agora, com o ICMS incluído na base de cálculo. Só depois de julgado o embargo de declaração e não cabendo novos recursos - quando, no jargão jurídico, o processo tiver transitado em julgado - é que haveria a obrigação de mudar a tributação, o que resultaria em perda de arrecadação.

A previsão do procurador é que até a apresentação do recurso leve até dois meses. Ele evita estimar prazo para o julgamento do embargo, mas acredita que isso ocorrerá ainda neste ano. Se o STF acatar o pedido, a Fazenda acaba com a possibilidade de que seja cobrado um passivo que obrigaria o governo a devolver R$ 100 bilhões, se considerados os últimos cinco anos (prazo para a causa prescrever).

Além disso, a PGFN argumentará que o prazo para a entrada em vigor da decisão é necessário por dois motivos: primeiro, porque a alteração da alíquota do PIS e da Cofins só pode ser feita por projeto de lei ou medida provisória, o que depende de tramitação no Congresso Nacional. Além disso, para a majoração do tributo há a noventena, ou seja, qualquer alteração só pode entrar em vigor 90 dias depois.

O procurador disse que ainda não está fechado se a União apresentará outros pedidos. Em tese, os embargos podem levar inclusive a um novo julgamento, mas o procurador explica que isso não é comum. A PGFN só poderá apresentar o recurso depois que o STF publicar o acórdão e a procuradoria for intimada. Depois disso, terá 10 dias para apresentar os embargos. A previsão do procurador é que todo esse processo leve até dois meses.

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, argumenta que o efeito real será "sensivelmente menor". De acordo com o ministro, uma avaliação mais precisa não é possível, porque não há dados na Justiça sobre o número de ações protocoladas no Brasil. No entanto, segundo a PGFN, há cerca de 10 mil processos suspensos nas instâncias de origem e que aguardavam a definição do Supremo sobre o caso para serem concluídas.

A decisão do Supremo deve incentivar o questionamento da cobrança de outros tributos. "O Imposto sobre Serviços também entra na base de cálculo do PIS/Cofins. Os prestadores de serviços vão passar a ficar de olho nisso. Também será possível pedir a redução da contribuição previdenciária sobre o faturamento cobrada dos setores que fazem parte da desoneração da folha de pagamento, da taxa do cartão de crédito e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido", diz o coordenador do curso de Economia do Ibmec, Márcio Salvato.

Resolução do Supremo Tribunal Federal repercute no País

A decisão do Supremo Tribunal Federal de que o ICMS não compõe a base de cálculo do PIS e da Cofins tem repercussão geral - ou seja, juízes e tribunais de todo o País são obrigados a aplicar o mesmo entendimento ao analisar processos semelhantes. Ou seja, a partir de agora, qualquer empresa pode recorrer na Justiça, uma vez que está caracterizada a violação constitucional do tema.

"O STF entendeu que o ICMS não é um conjunto de valores que integram o faturamento das empresas, mas sim uma despesa, pois não revela qualquer medida de riqueza, não devendo haver, portanto, a incidência deste tributo", reforça Beatriz Dainese, advogada do escritório Giugliani Advogados.

A polêmica aguardava uma decisão final da Corte há uma década. Em 2014, o STF já havia declarado esse entendimento sobre o cálculo de PIS/Cofins. No entanto a decisão tinha sido tomada em um caso específico, sem repercussão geral. Agora, a regra vale para todas as empresas. Sem incluir o ICMS no cálculo de PIS/Cofins, o valor dos impostos recolhidos pelos contribuintes cairá.

O placar ficou em seis votos a quatro contra a União. Votaram a favor dos contribuintes a presidente do tribunal, ministra Cármen Lúcia, e os ministros Rosa Weber, Luiz Fux, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio Mello e Celso de Mello. A favor da União votaram os ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli e Gilmar Mendes.

A decisão foi tomada no recurso proposto pela empresa Imcopa Importação, Exportação e Indústria de Óleos, que produz óleos industriais. O argumento usado pela defesa era que o ICMS arrecadado não pode ser considerado receita ou faturamento - e, por isso, não pode ser incluído na base de cálculo de PIS/Cofins. E ainda afirmou que uma decisão favorável à tributação que considerasse o ICMS como receita iria ferir a repartição de receitas entre os entes da Federação. Isso porque o ICMS é um imposto estadual, enquanto PIS e Cofins são federais. "Tributos não devem integrar a base de cálculo de outro tributo. A receita de terceiros não deve integrar a base de cálculo da tributação", disse Barroso.

No processo, a PGFN sustentou não haver proibição constitucional à incidência de tributo sobre tributo. Por isso seria permitido que a base de cálculo de PIS/Cofins abrangesse o ICMS. Mendes, que concorda com essa tese, afirmou que, com a perda de arrecadação, a União provavelmente aumentará outros impostos.

"A exclusão do ICMS do cálculo gera consequências perversas ao sistema tributário e à Seguridade Social, como o aumento de alíquotas para fazer face às perdas de receitas para custear o Estado. A decisão vai desonerar o contribuinte a curto prazo, porque obriga o Estado a instituir novos tributos, se tiver um mínimo de responsabilidade."

O tributarista Everardo Maciel, ex-secretário da Receita Federal, classificou a decisão do STF de "maluquice". Para ele, a repercussão sobre o sistema tributário pode ser catastrófica, e o contribuinte será o maior prejudicado, pois, fatalmente, terá de pagar mais impostos. "É uma maluquice, uma coisa completamente absurda. O contribuinte terá de pagar por isso. Não há outro jeito." Já o diretor de políticas estratégicas da Confederação Nacional da Indústria (CNI) elogiou a decisão.

Para ele, a incidência de um imposto sobre outro sempre foi uma anomalia. "A CNI sempre defendeu a não incidência de um imposto sobre outro. Todas as propostas de reforma tributária no Brasil buscam eliminar essa distorção."

 

Fonte: Jornal do Comércio