STF abre exceção quanto à guerra fiscal benéfica às minorias

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Desenvolve-se no Brasil, há algumas décadas, uma guerra que envolve todos os poderes do Estado e algumas instituições independentes.

Desenvolve-se no Brasil, há algumas décadas, uma guerra que envolve todos os poderes do Estado e algumas instituições independentes. Falo da guerra fiscal, expressão que caracteriza a competição entre os estados-membros para atrair a força produtiva para suas áreas por meio de incentivos fiscais, notadamente os de ICMS. 

Durante os últimos 25 anos, o Supremo Tribunal Federal apresentou uma jurisprudência que dizia que os benefícios de ICMS que não forem alvo de prévia deliberação do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) são inconstitucionais. Todavia, há poucos meses a Corte apresentou argumentos refinados abrindo uma exceção importante a sua conhecida posição. 

No julgamento da ação direta de inconstitucionalidade nº 429, de relatoria do ministro Luiz Fux, um dos dispositivos atacados era o § 2º do artigo192 da Constituição do Estado do Ceará, que concedia isenção de ICMS aos implementos e equipamentos destinados aos deficientes físicos auditivos, visuais, mentais e múltiplos, bem como aos veículos automotores de fabricação nacional com até 90 HP de potência adaptados para o uso de pessoas portadoras de deficiência.

O normal seria a Corte derrubar o dispositivo com efeitos retroativos. Não havia prévia autorização do Confaz. Contudo, numa posição liderada pelo ministro Luiz Fux, incrementada pelo ministro Gilmar Mendes e refinada pelo ministro Luís Roberto Barroso, operou-se uma mudança de postura, fazendo nascer o estado da arte quanto à proteção, por meio de políticas fiscais, de grupos vulneráveis reconhecidos constitucionalmente.  

O ministro Luiz Fux declarou a inconstitucionalidade do dispositivo que incentivava produtos para deficientes, contudo, preservando os efeitos gerados por ele no passado. O ministro Gilmar Mendes achou por bem conceder 12 meses para que o Estado do Ceará se articule junto ao Confaz para sanar a derrubada do benefício, ou seja, ele permaneceria em vigor por mais um ano. É a conhecida modulação de efeitos. Ao acompanhar a iniciativa, o ministro Barroso indagou se aquela exceção estaria sendo aberta para resguardar a situação dos deficientes. Ao ouvir a resposta afirmativa, disse: “Então estou de acordo”.

A proteção às minorias é a marca do constitucionalismo contemporâneo. Há várias formas de estabelecer garantias a grupos que precisam de ações positivas para que possam estar em posição de isonomia com os demais. 

O Brasil tem reafirmado seu compromisso com as pessoas com deficiência. Além do Decreto nº 6.949, de 2009, que promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, a Constituição Federal traz inúmeros dispositivos assegurando direitos e garantias a esse grupo vulnerável, seja no mercado de trabalho, seja no amparo decorrente de políticas públicas. 

Ao enaltecer o dever constitucional de proteção às pessoas com deficiência e permitir que benefícios fiscais de ICMS a elas concedidos não contem com o mesmo tratamento severo que é imputado às demais atividades, o STF abriu espaço para que os Estados estimulem a produção de instrumentos que tornarão mais fácil a vida de quem, pela imposição da natureza, tem necessidades maiores quanto a alguns aspectos da vida.  

Próximo da proclamação do resultado, o ministro Luís Roberto Barroso fez novamente uso da palavra para esclarecer: “Nós estamos fazendo essa exceção pela singularidade de estarmos protegendo as pessoas deficientes. Não estamos chancelando em amplo espectro a concessão de isenções para a posteriori se submeter ao Confaz”.

Não há dúvidas de que a Suprema Corte conferiu um caráter virtuoso à já virtuosa política fiscal cearense. Um tratamento excepcional, mas de muito valor.  

 

 

 

FONTE: VALOR ECONÔMICO