Por uma reforma tributária justa para todos

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O Brasil corre o risco de ser um país campeão na produção de alimentos e, ao mesmo tempo, líder nos altos preços da comida

 

O sistema tributário brasileiro é complexo, burocrático e fonte permanente de insegurança jurídica. Não há dúvida que precisa ser reformado, simplificado, mas é fundamental que as mudanças não aumentem a carga tributária da sociedade e nem dos produtores de alimentos do país.

Para o setor agropecuário, e para a sociedade brasileira, que precisa comprar alimentos, as propostas de reforma tributária que visam alterar a legislação sobre o consumo não resolverão as questões da simplificação, tampouco reduzem a insegurança jurídica. E, ainda, deverão ampliar a carga de tributos sobre os alimentos ou sobre os produtores rurais. Após várias décadas debatendo e esperando um modelo justo, as atuais propostas preocupam.

Em diversos fóruns, audiências públicas e posicionamentos públicos, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) apresentou, tecnicamente, todos os problemas das propostas de emendas constitucionais (PECs) em debate e, consecutivamente, apresentou sugestões de melhorias.

A PEC que tramita no Senado, por exemplo, substitui vários tributos federais por dois novos IVA’s (Impostos de Valor Agregado): um de responsabilidade federal, outro estadual e municipal. O problema dessa proposta está nos detalhes.

Caso a proposta seja aprovada da forma que se encontra, os produtores rurais pessoas físicas – que são 98% dos produtores brasileiros, segundo o último Censo Agropecuário do IBGE – não seriam contribuintes diretos do IVA-Federal. Entretanto, seriam contribuintes do IVA Estadual/Municipal, e obrigados a terem uma contabilidade mensal. Ou seja, na questão da simplificação para os produtores rurais, a PEC traz mais burocracia e dificuldade operacional do que o regime atual.

Adicionalmente, os insumos agropecuários (fertilizantes, sementes, mudas, medicamentos veterinários etc) seriam tributados com o IVA-Federal. Mas isso não daria crédito aos produtores, apenas para a agroindústria adquirente da produção agropecuária, com um crédito presumido em um percentual muito reduzido. Ou seja, a cumulatividade tributária será agravada na produção de alimentos.

De outro lado, a tão debatida alíquota única. Segundo estudo da OCDE realizado em 2020, de 35 países que se utilizam do modelo do IVA e que possuem uma produção agrícola relevante, a grande maioria dos países não têm alíquota única. Países como França, Itália, Espanha e Turquia possuem porcentagens diferenciadas para bens e serviços essenciais, incluindo alimentos. A proposta brasileira vai na contramão do mundo e busca tributar alimentos com a mesma taxa para produtos de luxo.

Defensores da proposta argumentam que a população carente consome mais bens do que serviços. Portanto, a maior alíquota sobre serviços seria mais justa, o que é verdade. Mas não tratam em público que a proposta traz consigo um brutal deslocamento da carga tributária de outros setores para os alimentos e que isso será repassado nos preços ao consumidor.

O Brasil corre o risco de ser um país campeão na produção de alimentos e, ao mesmo tempo, líder nos altos preços da comida cobrados de sua população. Sobre esse argumento, alguns dizem que o crescimento econômico advindo da reforma será suficiente para a elevação da renda. E o argumento é esse: confie que vai dar certo.

Segundo a última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do IBGE, no primeiro trimestre do ano, o rendimento médio mensal foi estimado em R$ 2.548, lembrando que 10,5% das pessoas estão sem empregos no Brasil, portanto, sem rendimento salarial. Associada a essa questão, visualizamos a elevação dos preços dos alimentos, tanto no Brasil quanto no mundo. Não nos parece correto elevar o custo de alimentos para aumentar arrecadação tributária ou beneficiar setores com o deslocamento da carga tributária.

A CNA continua aberta ao debate público e na defesa de uma reforma tributária justa para todos, mas não pode se calar diante dos riscos que as propostas apresentam ao setor e, principalmente, à sociedade brasileira.

Fonte: revistagloborural