Em pauta no Senado, Imposto de Exportação sobre combustível é visto como ineficaz

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Especialistas ouvidos pelo JOTA criticam criação do tributo como política eficaz para estabilizar preço nas bombas

A discussão sobre a tributação dos combustíveis deve movimentar o Legislativo no começo de 2022. Além das discussões em torno da PEC que abre espaço para a redução de tributos sem compensação fiscal, o Congresso tem na pauta o polêmico PL 1.472/21, que prevê a criação de um Imposto de Exportação sobre petróleo bruto.

Especialistas ouvidos pelo JOTA, porém, criticam a criação desse imposto como política tributária eficaz para estabilizar o preço dos combustíveis nas bombas. Para eles, a medida, além de não surtir o efeito esperado ao consumidor, extrapolará a função extrafiscal desse tributo e representará uma intervenção indevida na economia de mercado, com consequências negativas sobre a atração de investimentos estrangeiros e sobre o funcionamento do setor de petróleo e derivados no Brasil.

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, disse que poderá pautar o PL 1.472/21 em plenário em fevereiro. De autoria do senador Rogerio Carvalho (PT-SE), o projeto foi aprovado na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) da casa em dezembro e busca conter a disparada no preço dos combustíveis por meio de um tripé: a criação de um programa de estabilização para reduzir a volatilidade dos preços de derivados de petróleo; a criação de uma nova política de preços internos para derivados de petróleo; e a formação de uma espécie de fundo com um conjunto de possíveis fontes de recursos para conter os reajustes.


O ponto mais polêmico é justamente a instituição do Imposto de Exportação sobre petróleo bruto como uma fonte de recursos dentro desse programa. Pelo projeto, a alíquota desse imposto, a depender da parcela do valor do petróleo bruto exportado, pode variar de 2,5% a 20%.

Na exposição de motivos do projeto, o senador Rogério Carvalho, ao comentar especificamente o Imposto de Exportação, observa que há uma elevação nas exportações de petróleo, de um lado, e o aumento na capacidade ociosa das refinarias, de outro.

“Com a exploração dos campos do pré-sal, o Brasil vem ampliando as exportações de óleo cru, ao mesmo tempo em que os elevados preços praticados pela Petrobras implicaram aumento das importações de derivados. Houve, inclusive, aumento da capacidade ociosa das refinarias da Petrobras, que chegou a 30%, dada a evolução das importações”, diz o senador, que ressalta que o Brasil deve utilizar o pré-sal em favor do desenvolvimento do país e da autossuficiência de derivados do petróleo.

“Além da afronta à lei, não faz sentido que o Brasil se torne exportador de óleo cru e importador de derivados, prejudicando a população e a economia com preços de derivados elevados e voláteis”, diz.

Imposto fere princípio do país de destino
A advogada Renata Emery, sócia da área tributária de TozziniFreire Advogados e especialista em tributação de combustíveis, afirma que, antes mesmo de uma análise aprofundada sobre o seu impacto econômico, a criação desse imposto fere o princípio do país de destino, aplicado na tributação no comércio exterior. De acordo com esse princípio, os bens e serviços devem ser tributados exclusivamente no país de destino, onde ocorre a importação, ao passo que, no país de origem, as exportações devem ser desoneradas.

“Esse princípio garante que um país não exporte tributos, e, com isso, os produtos possam competir em condição de igualdade no mercado internacional. O bem ou serviço deve competir no exterior a partir de seu custo de produção, sem a tributação”, explica Renata.

PL é inconstitucional, diz advogado
Para o sócio da área tributária do escritório Machado Meyer, Diogo Martins Teixeira, criar um Imposto de Exportação com o objetivo de utilizar a sua arrecadação para conter os reajustes fere a própria Constituição. Ele explica que, pelas regras do artigo 167, inciso IV, da Carta, é vedado vincular a receita de impostos a órgão, fundo ou despesa.

“O imposto de exportação é extrafiscal, ou seja, o governo não pode utilizá-lo com fim arrecadatório, tampouco pode vincular a sua arrecadação a esse fundo de equilíbrio”, afirma Teixeira.

Quando um tributo é extrafiscal, caso do Imposto de Exportação, a sua finalidade vai além da arrecadação de recursos. Ele pode ser utilizado para incentivar ou desincentivar uma prática ou regular um mercado, por exemplo.

Para Renata, mesmo que fosse possível destinar a arrecadação do Imposto de Exportação a um fundo, a medida não resultaria em estabilização do preço dos combustíveis na bomba. Isso porque, afirma, o Brasil sequer tem capacidade de refinar todo o petróleo que produz.

“Eu enxergaria um caráter extrafiscal na criação desse imposto se, ao desestimular a exportação de petróleo, eu pudesse refinar todo o produto internamente e transformá-lo em combustível, o que não é possível”, diz a advogada. “Assim, o que se pretende com esse imposto é gerar caixa para subsidiar um dos tripés da proposta, ou seja, a criação do fundo, e aí sim, em um segundo momento, tentar reduzir o preço do combustível. Então me parece que a extrafiscalidade está em um segundo nível”, afirma Renata.

Intervenção na economia de mercado
O advogado e economista Eduardo Fleury, sócio e head da área tributária do escritório FCR Law, afirma que o projeto propõe uma intervenção na economia que praticamente “joga fora” uma empresa de mercado como a Petrobras. Fleury afirma que a criação de um Imposto de Exportação sobre petróleo bruto terá como consequência uma redução nos lucros da Petrobras, uma vez que a empresa, em vez de reduzir as vendas, deverá internalizar esse custo para manter o preço do petróleo e conseguir competir internacionalmente.

“A criação do imposto tocará artificialmente no lucro da Petrobras, impedindo na verdade uma concorrência mais livre. É uma intervenção forte no mercado que é perigosa”, avalia.

Para Fleury, uma medida mais racional seria o governo elevar o imposto de renda sobre os lucros do petróleo e, com os recursos, subsidiar por exemplo o diesel utilizado no transporte público.

“Pode-se criar um sistema para compensar quem de fato precisa, porque reduzir o preço na bomba vai beneficiar quem pode andar de carro. É mais racional deixar a classe média pagar pelo preço do combustível e subsidiar quem de fato precisa”, afirma o especialista.

Fleury defende ainda que, em vez de empenhar esforços na redução do preço dos combustíveis, é necessário mudar a matriz energética do Brasil, para a utilização de fontes de energia limpas.

“Há um problema sério que é o ambiental. Toda vez que você incentiva a redução do preço do petróleo, você dá sobrevida a ele. É preciso entender que o preço da gasolina alto faz parte de um momento de mudança de matriz energética”, afirma.


Fonte: Jota