Imposto e burocracia são desafio às vendas on-line
Mudança feita pelos estados obriga empresários a pagar tributo na origem e no destino do item comercializado pela web. Medida trava possibilidade de expansão de mercado...
Mudança feita pelos estados obriga empresários a pagar tributo na origem e no destino do item comercializado pela web. Medida trava possibilidade de expansão de mercado.
Com crescimento superior a 20% ao ano e na contramão do momento econômico, o comércio eletrônico virou a menina dos olhos de empreendedores. Mas, este ano, o setor está diante de um desafio que pode ameaçar a sobrevivência de muitos que entraram nesse mercado. Desde 1º de janeiro, está em vigor o Convênio 93/2015 do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), que exige o recolhimento da diferença de alíquota entre os estados de origem e destinos de uma mercadoria. Agora, é preciso recolher o Imposto Sobre Circulação de Mercadorias (ICMS) do estado em que a venda é feita e também pagar o tributo no estado de destino. Assim, a grande vantagem do e-commerce de comercializar para diferentes lugares do país, virou pesadelo para empresários e muitos podem fechar as portas.
“É um golpe baixo para o e-commerce”, comenta o diretor do mercado e-commerce e professor de e-commerce e marketing digital, Breno Koscky. Segundo ele, com o novo convênio, os empresários têm que dividir impostos e fazer um trabalho que deveria ser dos órgãos públicos. Ele destaca que, com efeito maior sobre as transações do meio virtual, a norma é aplicável em qualquer negociação que envolva pessoa física ou jurídica. “Passou a ser um trabalho extraordinário para o empresário, por ser uma burocracia gigantesca”, comenta.
Isso porque, para se adequar ao que exige o Confaz, o empreendedor tem que enfrentar uma operação bem analógica: a empresa precisa calcular a diferença entre alíquotas, preencher a guia, pagá-la, imprimir o comprovante, anexar ao produto junto com a nota fiscal e só depois enviá-lo. Antes, a constituição federal previa que nas operações entre empresas e consumidor final, independentemente da forma, o recolhimento do ICMS era do estado de origem de onde a venda ocorria. “Agora, aquele que vende para outros estados terá que pagar impostos desse lugar de destino”, explica o advogado da Fecomércio, Marcelo Morais. Ele esclarece que, com a nova norma, o empresário que vende determinada mercadoria de Minas para São Paulo, por exemplo, terá que pagar a alíquota interestadual de 12% (percentual da região Sudeste) sobre o produto, mais a diferença entre o valor arrecadado e alíquota estadual daquele estado de origem.
É como, se por exemplo, um comerciante mineiro com um site virtual fizesse uma venda de uma mercadoria de R$
Carga maior
A nova regra onera todas as empresas do ramo com burocracia e custos de operação. As que fazem parte do Simples Nacional, com faturamento anual bruto de até R$ 3,6 milhões, são ainda mais afetadas, uma vez que, na prática, perdem o tratamento diferenciado de pagar oito tributos em via única. No caso do Simples, há um aumento da carga tributária, pois o diferencial que o empresário terá de recolher não está contemplado naquela alíquota unificada, conforme explica Morais.
Agora, o empresário, segundo a nova norma, terá que saber, antes de vender para um estado, a legislação de lá. “Alguns locais cobram um cadastro de contribuinte. Então, se a pessoa vende para o Pará e lá é exigido isso, ela terá que procurar a Secretaria de Fazenda do estado, fazer o cadastro e recolher imposto com guia para aquela mercadoria. No pior cenário, o empresário terá que contratar um despachante no lugar para fazer essa burocracia”, comenta. Tudo isso, segundo Morais, gera um custo operacional grande. “Além de um aumento da carga tributária. É um complicador, sendo que muitas cidades e empresários não estão nem sabendo disso”.
Progressão
Em 2016, o estado de destino recebe 40% do recolhimento das alíquotas compartilhadas, porém, com o passar dos anos, esse percentual aumenta. E, até 2019, ficará 100% com o estado consumidor. A mudança inverte a natureza do imposto, até então totalmente retido no estado vendedor, e é resultado da mobilização de unidades da federação que viram a arrecadação cair com o crescimento do e-commerce no país. Em 2015, o comércio eletrônico faturou R$ 41,3 bilhões, de acordo com dados do E-bit, especializada no monitoramento da modalidade no país.
Problema no virtual
Bolsa de R$ 100
Venda de um site mineiro para consumidor de São Paulo
» Alíquota interestadual 12% (destinado a MG) = R$ 12
» Diferencial de Alíquota (Difal) 6% = R$ 6
» 40% do Difal para SP = R$ 2,40
» 60% do Difal para MG = R$3,60
Venda de uma bolsa de São Paulo para Minas Gerais para consumidor final
» Alíquota interestadual
12% (destinado a SP) = R$ 12,00
» Diferencial de Alíquota (Difal) 6% = R$ 6,00
» 40% do Difal para SP = R$ 2,40
» 60% do Difal para MG = R$ 3,60
Como era
» Vendas realizadas para outros estados recolhiam a alíquota interna integralmente para o estado de origem
Exemplo
Em Minas, o recolhimento do ICMS integral é 18%
Como ficou
» Vendas realizadas para outros estados recolhem a alíquota interestadual para o estado de origem, que também recebe parte da diferença entre a taxa interna do destino e da alíquota interestadual da origem. O restante deve ser recolhido em favor do estado de destino, até 2019.
EXEMPLO
» Alíquota do estado de origem Minas Gerais
18%
» Alíquota do estado de destino São Paulo
18%
» Alíquota interestadual
12% (percentual para a região sudeste)
» Diferença entre alíquota do estado de destino e interestadual
6%
Os 6% serão distribuídos da seguinte forma:
Em 2016
40%
para o estado de destino e
60%
para o estado de origem
Em 2017
60%
para o estado de destino e 40% para o estado de origem
Em 2018
80% para o estado de destino e 20% par ao estado de origem
Em 2019
100%
para o estado de destino.
Comerciante critica custo do e-commerce, mas vai segurar preço
Com um custo maior nas costas, os empresários do setor de e-commerce estão fazendo de tudo para não repassar o prejuízo aos consumidores. “Assim que soubemos das mudanças, procuramos o serviço de contabilidade para nos ajudar”, comenta Andreza Gontijo, sócia da marca
A empresária diz não pretender aumentar os preços dos seus produtos, por enquanto. “Não é o momento de aumentar as coisas. Os consumidores estão diante de uma inflação alta e orçamento apertado. Porém, na nossa próxima coleção de verão vamos ajustar os valores de acordo com o impacto que essa norma trouxer para nós”, garante. O advogado da Fecomércio, Marcelo Morais, diz que, no ano passado, quando orçou um computador por site, ele custava R$ 2, 1 mil e, agora, está R$ 2,5 mil. “Aumentou, certamente, pela tributação”.
Para Abel Berto Rosa, diretor financeiro da marca Huddies, com loja virtual em BH desde novembro, a situação pesa para o empresário. “Aumentou os custos e, aqui na loja, temos que colocar um funcionário para fazer essa burocracia todos os dias”, conta. A loja, que vende utensílios domésticos, atende todo o Brasil, com uma remessa de 30 produtos por dia. De acordo com Rosa, muitos locais do país não estão preparados para a mudança. “A nossa sorte é que já temos um cadastro na região Sudeste, o que nos facilita. Não podemos aumentar os preços agora, uma vez que já vendemos importados e o dólar está nas alturas. Então, por enquanto, não vamos repassar”, diz.
FECHAMENTO Entidades de todo o país estão se mobilizando para reformular a norma do Confaz. Ontem, a Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (ABComm) entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF). O requerimento visa cancelar cinco das onze cláusulas, que estipulam novas regras para o recolhimento do ICMS em transações interestaduais.
O grande medo das entidades é de que as empresas de e-commerce fechem as portas. Segundo comenta a analista de políticas públicas do Sebrae, Ariane Vilhena, a burocracia enfrentada por uma empresa de pequeno porte vai contra o que prega o estatuto nacional das micro e pequenas empresas, que tem como objetivo simplificar a vida do empresário. “É inviável para esses comerciantes contratar um contador para cada venda feita. As grandes empresas podem até conseguir fazer isso, mas as pequenas vão acabar fechando as portas”, comenta Vilhena.
Outro problema citado por ela é que muitas empresas podem se negar a vender determinado produto a um lugar do país, o que vai contra ao que prevê o direito do consumidor. “E neste momento da economia, elevar o preço de um produto pode impedir o consumo”, alerta. Ela avisa que o Sebrae MG está se mobilizando para revisão da norma.
Enquanto isso...
...inflação chega ao varejo na internet
Os preços de produtos vendidos no comércio eletrônico seguiram num ritmo de crescimento recorde para o setor
Fonte: Fenacon